Tribuna aberta da juventude e dos estudantes em mesa redonda internacional para analisar os casos de Mumia Abu-Jamal e Shaka Sankofa, realizada nos estúdios da TV Cubana, no dia 19 de Junho de 2000,

Randy Alonso.- Boa tarde a todos os nossos telespectadores e radiouvintes. Àqueles que conhecem o sistema jurídico e o sistema penal norte-americano, doe-lhes e desaponta-lhes, mas não lhes resulta alheio, o fato de que um menino cubano de seis anos sofra a apreensão arbitrária e o abuso injustificado de estar longe de sua pátria.

Os casos de erros judiciais, condenas pela cor da pele ou pela pobreza, o uso de falsos testemunhos, abuso nos cárceres, são freqüentes na sociedade norte-americana. Hoje, em nossa mesa redonda, falaremos destes temas e de alguns casos que merecem a atenção da opinião pública e, em especial, do povo cubano, entre eles, de maneira particular, o de Mumia Abu-Jamal, jornalista e militante do movimento político negro em Filadelfia, que foi acusado injustamente da morte de um polícia branco, e condenado à pena de morte, há 18 anos.

Para esta análise, me acompanha na mesa redonda de hoje um painel de carácter especial.

Estão conosco nesta tarde, a senhora Pam África, coordenadora da organização internacional Concerned Family and Friends of Mumia Abu-Jamal; Rosemari Mealy, advogada de Nova Iorque e amiga de Mumia, quem, aliás, é uma ativista importante da comunidade afro-americana em Nova Iorque; Leonard Weinglass, prestigioso advogado de um cartório de advogados de Nova Iorque, formado na Universidade de Yale, e que é o principal advogado da defesa de Mumia Abu-Jamal.

Também nos acompanham a senhora Gloria Rubac, ativista e participante no movimento sobre os cárceres e a pena de morte em Texas; uma pessoa que já tem estado conosco noutras mesas redondas, a senhora Gloria La Riva, que é dirigente sindical em Califórnia e, aliás, membro do International Action Center; Gloria tem estado ativa durante muito tempo na solidariedade com Cuba; Lennox Hinds, professor de Direito da Universidade de Rutgers e prestigioso advogado nos Estados Unidos, e Mónica Moorehead, dirigente do Partido Mundo Operário e aspirante à Presidência dos Estados Unidos da América por esse partido.

Esta é a composição de nosso painel na tarde de hoje. Como vocês poderão constatar é uma mesa redonda com características especiais. Vamos ter interpretação simultânea para nossos telespectadores, para que percebam e escutem o que vai ser debatido nesta mesa redonda, que julgo que é muito importante para nós, para nosso povo e para continuar conhecendo de perto a tramóia da sociedade norte-americana em seu conjunto.

Casualmente, um dia como hoje, há 47 anos, às 20h.00, foram executados nos Estados Unidos os esposos Julius e Ethel Rosenberg, vítimas da guerra fria e do sistema político e judiciário norte-americano. Ao morrer, deixaram dois filhos pequenos, um deles, Robert, tinha apenas seis anos de idade, como nosso Elián González Brotons. Esse foi um dos piores crimes da época; depois têm sido outras as vítimas, uma delas é Mumia Abu-Jamal.

O quê sentiu esse jornalista e militante político depois que o condenaram injustamente à pena de morte?

Vejamos este vídeo em que ele conta suas experiências.

Mumia Abu-Jamal.- Sou totalmente inocente dos delitos que me são imputados; não sou culpável do que se me acusa.

Jornalista.- O quê sentiu quando foi condenado a morte em 1982?

Mumia Abu-Jamal.- Acho que senti raiva, uma raiva intensa. Tinha a sensação de que a injustiça penetrava no mais profundo de minha alma; raiva, injustiça, afronta, medo, sensações todas elas misturadas que vinham de todas partes; mas tinha a certeza de que não poderiam perdurar, a certeza de que seriam devolvidas, e ainda acredito nisso.

Randy Alonso.- Essas foram as declarações de Mumia, de cómo se sentiu quando soube que foi condenado injustamente à pena de morte.

Pam, você que conhece Mumia, que esteve nessa época em Filadélfia, quê ambiente, quê contexto se vivia em Filadélfia no momento em que Mumia foi condenado à pena de morte?

Pam Africa.- Era a época, e ainda é, de um dos governos mais brutais, opressores e racistas do mundo. Mumia queria denunciar o racismo e a brutalidade do governo do prefeito Rizzo, em Filadélfia.

Naquele momento um jovem negro com o nome de Cornell Warren, um trabalhador que regressava de seu trabalho, foi algemado com suas mãos às costas, conduzido à parte trasseira do museu afro-americano e lhe deram um tiro na parte de atrás da cabeça de forma deliberada.

Winston X Hood, outro homem negro, foi espancado de forma selvagem e depois foi morto. Nenhum desses oficiais da polícia passaram nem um dia no cárcere.

José Reyes, outro latino, foi espancado até a morte diante de sua mulher.

Mumia desejava denunciar isto quando entrou em contacto com a organização MOVE. O governo ocultava nesse momento o assassinato brutal de um bebé de três semanas de nascido, Life Africa da organização MOVE, e Mumia expressou que isto o tinha sentido no mais profundo, que queria levar isto aos tribunais e queria denunciá-lo; era uma injustiça total.

Mumia começou a dar cobertura de imprensa nos julgamentos da organização MOVE, e pouco tempo depois, o governo do prefeito Rizzo atacou a sede da organização, e apesar de todas as provas e o amplo apoio da comunidade, foi declarado claramente que a organização MOVE era uma organização revolucionária e sua vontade era expor as injustiças. O que Mumia viu e viram outros, foi o ataque brutal, a tentativa de assassinar pessoas diante dos olhos de todos, e diziam que os homens negros que tinham assassinado, tinham atacado o governo, que atracavam à polícia. Mas o que Mumia viu e foi exposto no mundo, foi o espancamento que lhe deram a Delbert Africa, um homemn que tinha seus braços levantados, que não levava armas, e, perante o mundo, este homem foi acusado de ter um revólver e uma carabina. Mumia se envolveu neste caso e por isso foi perseguido pelo governo.

Rosemari Mealy.- Randy, se posso acrescentar mais uma coisa antes da participação de Mumia na organização MOVE. Gostariamos levar o público a 1967. Em Filadélfia, 3 000 estudantes levaram a cabo uma manifestação em frente da Junta de Educação dessa cidade, exigindo um programa de cultura para os negros. Nesse momento, Mumia tinha entre 13 e 14 anos de idade e chefiou esse movimento até certo ponto.

Eu diria que nos documentos e arquivos do FBI, que seu advogado analisará aqui nesta noite, Mumia já estava identificado pela polícia de Filadélfia, numa etapa bem precoce; ambos eram membros do Partido Black Panters em Filadélfia nessa altura, e Mumia desempenhava um papel de direção ainda antes de fazer os 16 anos. Nessa época, Filadélfia era conhecida como uma das piores cidades, atacavam os grupos comunitários, às organizações comunitárias que ousavam desafiar e lutar em contra da brutalidade das forças policiais dessa cidade.

Houve muitos assassinatos semelhantes aos mecionados por Pam, onde Mumia –sob sua chefia no Partido Black Panters- organizava os membros do partido para irem às comunidades e identificar àqueles policiais que estavam acusados de assassinar à juventude da cidade. Ele nos organizava para produzir cartazes, que colamos pela cidade toda, com as fotos daqueles policiais, o que indignou o governo do prefeito Rizzo, e novamente ele foi identificado como líder.

Posteriormente, o Partido Blanck Panters organizou uma convenção revolucionária em Filadelfia e em esse momento queríamos voltar a escrever a Constituição dos Estados Unidos da América, devido às realidades do que acontecia em nossa comunidade nos Estados Unidos. Mais uma vez, o governo de Rizzo, que trabalhava em conluio com o FBI, organizou um ataque concertado em contra do Partido Black Panters , e atacou nossa organização, e até certo ponto queriam opor à comunidade afro-americana à militância do Partido Black Panters . Obrigavam os homens dos Black Panters a se despirem nas ruas, enquanto nós éramos despidas para semos registradas, e nesse instante o prefeito disse: Vieram o que fiz?, apreendi esses membros do Partido Black Panters de calças tiradas. Isto foi uma tentativa deliberada para socavar e destruir o partido, porque obrigava à direção do Partido Black Panters a estar na cadeia com altas fianças. Aos 15 anos de idade, Mumia era líder dentro do Partido Black Panters em Filadélfia, e isto enfureceu o Departamento da Polícia.

Quando se formou como jornalista utilizava esses meios para expor ante todo o mundo, no jornal do Partido Black Panters o que acontecia nessa cidade, e isto simplesmente enfurecia aos polícias e ao prefeito, até o ponto de ser identificado como uma ameaça para a comunidade; assim o estimou o FBI e era preciso apreendê-lo. A partir dai, suas relações com a organização MOVE eram as de uma pessoa que estava registrada como militante, como um revolucionário por parte das forças dessa cidade.

Randy Alonso.- Obrigado, Rosemari, por nos ter oferecido também teu ponto de vista. Foste amiga de Mumia, continuas a visitá-lo no cárcere, e acho que é muito importante que junto de Pam nos tenhas dado uma visão de quem era Mumia, como decorria Filadélfia nessa etapa do ano 1982, quando ele foi condenado injustamente, e quero que vejamos esta síntese de um material que transmitiu a rede HBO, onde o prórpio Mumia conta como ele se lembra daquela noite em que aconteceu o suposto crime.

Jornalista.- O mais próximo da realidade daquela noite está inserido em seu recente livro, passando do sub-real para o quase abstrato. Jamal descreve as sensações que experimentou ao perder e recuperar a consciência depois de ter sido ferido.

Mumia.- Estou como dormido, porque a mente não parecia dormida como todo o resto. O tempo parece mais lento, mais fácil, menos oprimente, sinto-me raramente ligeiro. Olho para abaixo e vejo um homem atirado na esquina, com a cabeça apoiada no seu peito, seu olhar para abaixo: Bolas! Esse sou eu.

Um calafrio de reconhecimento percorre todo meu corpo. Um policial se aproxima do homem, dá-lhe um pontapé na cara; sinto-o? Não, não o sinto. Outros três policiais se juntam à dança e començam a dar-lhe pontapés, a espancar com o cacete àquela massa tombada, sangrante e algemada; dois dos policiais o levantam pelos braços e o lançam de cabeça contra um poste de aço. Cai ao chão. Pai? Diz lá filha. Por quê esses homens estão te espancando assim? Não te preocupes, estou bem. Mas, papai, por quê? Por quê te dispararam e espancaram com os pés e as mãos? Acho que havia muito tempo que eles desejavam fazê-lo, minha filha, mas não se preocupe, papai está bem. Você vê, não sinto nada.

Quando recuperei a consciência, estou algemado, meu hálito é doce e tem o forte sabor metálico do sangue, estou na escuridão, atirado no piso de uma caminhonete e finalizo como uma massa anônima estrangulada, junto da rádio. Não sinto dor, só a pressão que dificulta cada hálito sangrento.

Estou a caminho do prédio de Governação, supostamente caminho à morte.

Randy Alonso.- Temos escutado este relato de Mumia, em um de seus livros, em que fala daquela noite tenebrosa que o levou para a condenação injusta, para a pena de morte.

Leonard, você que tem sido o principal advogado defensor de Mumia, na sua opinião, como tem sido este processo legal, quê irregularidades foram cometidas e que passos foram dados neste processo?

Leonard Weinglass.- O caso de Mumia Abu-Jamal reflete a longa história dos litígios da pena capital empregada contra os negros norte-americanos nos Estados Unidos da América. Infelizmente, a situação continua a mesma na atualidade.

Como afro-americano de 28 anos, Mumia foi acusado do assassinato de um polícia branco. Esse julgamento, como o julgamento de muitos outros que enfrentaram situações similares, refletiu os três fatores que fazem com que estes procedimentos sejam bem injustos, sob qualquer parâmetro: a raça, a classe e a política.

No que se refere à raça, um estudo realizado pela instituição governamental mais prestigiosa dos Estados Unidos, o Gabinete Geral de Contabilidade, chegou à conclusão de que era inegável que nos litígios em relação com a pena capital, a raça constituia um fator, e isto se reflete na população que se encontra no corredor da morte. Na cidade de Filadélfia, onde procede Mumia, há 126 pessoas no corredor da morte; delas, apenas 13 são brancas.

Quando se analisa a história, houve 18 000 execuções nos Estados Unidos da América nos 200 anos de história da república, e desses 18 000 executados, só 38 foram execuções de pessoas brancas, acusadas de ter morto a pessoas negras, de modo que não só se trata da raça do acusado, mas também da raça da vítima. Evidentemente, nos Estados Unidos uma vida branca vale muito mais do que uma vida negra.

No que diz respeito às classes, mais uma vez é induvitável que entre os 3 600 homens e mulheres que se encontram no corredor da morte nos Estados Unidos não existem milhonários, não há ninguém que pertença à classe média alta. De fato, Mumia é um dos poucos que, inclusive, se encontra na classe média.

Esta população dos corredores da morte está integrada fundamentalmente pelos mais pobres entre os pobres; o produto daqueles que têm as piores condições de moradia nos Estados Unidos, os da pior educação, os do pior atendimento médico, os de piores condições ambientais.

Um estudo destas 3 600 pessoas indica que mais de 90% em sua infância foram vítimas da violência sexual e da violência física, portanto, estas são as pessoas menos poderosas que existem no país, e em seus processos têm que depender de que o Estado lhes coloque um advogado de ofício, porque não contam com os meios para se defender a si próprias, e, como no caso de Mumia, o dinheiro que se precisa para a defesa, não existe. Mumia não teve um investigador quando se apresentou ao julgamento, não contou com dinheiro para que tivesse um especialista, para um perito em armas de fogo, para um médico e seu advogado, um homem patético que agora tem perdido a licença para exercer o direito, não fez nenhuma investigação, não falou com nenhuma das testemunhas, e admitiu que estava muito mal preparado para esse julgamento.

Já ouviram como a política tem influído no caso de Mumia; já Pam e Rosemari se referiram a isso. Porém, dentro do mesmo sistema, na maioria dos casos, isto constitui um fator. O procurador que decide se um caso deve ser condenado à pena capital ou não, é um funcionário eleito e conta com o apoio dos sindicatos da polícia; é uma pessoa que está pensando nas próximas eleições e não no caso, como uma questão de justiça.

O fiscal que ordenou a condenação de Mumia à pena de morte se converteu em prefeito da cidade de Filadélfia, e agora é o presidente nacional do Partido Democrata. Se ele tivesse decidido não julgar a Mumia, não se teria convertido em prefeito nem seria o presidente do Partido Democrata. Portanto, as ambições políticas constituem um fator, na maioria destes casos, e no próprio julgamento de Mumia o procurador empregou as declarações políticas que Mumia fizera há 12 anos, quando tinha 16 anos de idade, e as utilizou para convencer a este juri, de maioria branca, de que Mumia não apenas era um homem negro acusado de um crime, mas que era um radical político perigoso.

O Supremo Tribunal dos Estados Unidos tem manifestado que não podem ser utilizadas as filiações políticas de um homem para condená-lo à pena de morte. Mas neste caso sim, foi feito, e até estes momentos tem sido aceite. Seu caso designado a um juiz que tinha enviado a mais pessoas para o corredor da morte do que qualquer outro juiz dos Estados Unidos; de fato, tem enviado o duplo que o juiz que ocupa nestes momentos o segundo lugar no que se refere a cifra de pessoas que tem enviado para o corredor da morte. Esta pessoa anteriormente tinha enviado um homem inocente, por mais de 10 anos, antes de que se descobrisse que tinha sido alvo de um processo errado.

A polícia tem ameaçado as testemunhas de Mumia, e agora, uma senhora que foi testemunha, disse que mentiu quando prestou depoimentos porque tinha sido ameaçada pela polícia. Outras duas testemunhas disseram que não tinham prestado depoimentos porque a polícia os ameaçou se se apresentavam a testemunhar em favor de Mumia.

O mais alto funcionário que se encontrava na cena do crime quando aconteceu o caso de Mumia, foi acusado de corrução e dimitido de sua responsabilidade. De maneira que foi uma combinação entre o preconceito do tribunal com a ineficácia do advogado de Mumia que não apresentou as testemunhas a seu favor, e inclusive o seu irmão, que devia ter sido também testemunha. Alguns anos depois tentamos levar seu irmão ao tribunal –eu o tenho chamado-, mas o juiz disse que se seu irmão se apresentava a prestar declarações, seria enviado à cadeia na base de acusações que existem contra ele; e o irmão de Mumia me disse que se ele ia para a cadeia depois de prestar depoimentos em favor de seu irmão, a polícia o mataria, e portanto, não o fez.

Nestes momentos, após 18 anos, seu caso se encontra perante um tribunal federal nos Estados Unidos. Esta é a primeira vez que Mumia se encontra perante um juiz que não foi eleito e que tem um cargo vitalício.

Temos apresentado 29 demandas por separado solicitando um novo julgamento para Mumia. Todas estas demandas devem dar-lhe a Mumia um novo julgamento, e temos esperanças de receber uma resposta deste juiz antes de findar o ano, e poder levar Mumia ao tribunal para que possa receber um novo processo, com um novo juri, com um novo juiz, para que decida se Mumia é ou não inocente.

Temos a certeza de que sua inocëncia será esclarecida, mas temos um problema: em 1996 a lei mudou, e mudou de tal maneira que agora faz com que a apelação de Mumia, inclusive no tribunal federal, seja muito difícil.

É o mesmo problema que enfrenta Shaka, em Texas. Antes de 1996, Mumia tivesse tido uma boa oportunidade de passar um novo julgamento, mas nestas condições resulta bem difícil.

Estamos preocupados e houve uma ampla mobilização nos Estados Unidos, e também em outros países, para salvar Mumia. Temos esperanças de que quando este juiz federal finalmente escutar todas as provas, tenha o valor de não ter em conta esta lei de 1996, e dar-lhe a Mumia o que realmente tem merecido desde há 18 anos, isto é, uma oportunidade justa de demonstrar sua inocência.

Randy Alonso.- Falando nisso, você falava do tema de que a pobreza e a raça, evidentemente, tinham um peso importante nas acusações, nos delitos que lhes eram imputados às pessoas.

Estava lendo um dado que dá um editor de jornais norte-americano, Joel Olson, um livro que recentemente acaba de ser publicado, e ele dizia que nos Estados Unidos da América é crime ser pobre, e enquanto mais pobres formos mais criminosos nos vêm os outros, e que há 5 milhões de norte-americanos sem casas, 37 milhões não têm acesso ao seguro de saúde, 30 milhões são analfabetos e outros 30 milhões são analfabetos funcionais, mais de 1 milhão de cidadãos estão na cadeia, e aproximadamente 20% vive por baixo do nível de pobreza. Todos esses dados fazem parte também do panorama em que se desenvolve o sistema legal e o sistema policial que, evidentemente, tem um alto peso racista.

Mas me interessava também conhecer, Leonard, porque se fala muito dele –aqueles que conseguiram ver o material que passamos na televisão na quarta-feira passada, sobre o caso de Mumia, viram o juiz Sabo, que foi quem condenou Mumia, quem negou reiteradamente a apelação-, quem é Sabo, quem é esta personagem, o quê se passou com ele.

Leonard Weinglass.- O juiz Sabo, ao qual você faz referência, viu-se obrigado a aposentar-se por causa do Supremo Tribunal de Pensinvânia. Mas antes, fez dano no caso de Mumia. Esperaram até que ele ditou sentença, que foi muito prejudicial para aapelação de Mumia, e só depois de ter emitido esta sentença, foi obrigado a se aposentar. Ele devia ter passado à aposentaduria havia muito tempo.

Este juiz anteriormente foi um alto oficial da polícia, e o foi durante 16 anos antes de se converter em juiz. Como juiz continuou se considerando um funcionário policial. Foi membro do mesmo sindicato da polícia a que pertencia a suposta vítima do caso de Mumia. Pedimos-lhe que se retirasse do caso porque não era justo que participasse, contudo, se negou a fazê-lo. Já não se encontra no processo, se Mumia tem um novo julgamento, terá um novo juiz; mas ainda nos afectam as ações discriminatórias e de preconceito que ele desatou neste caso.

Randy Alonso.- Na sua opinião, para além do julgamento discriminatório, o caso de Mumia também se tornou praticamente em um julgamento político.

Leonard Weinglass.- Absolutamente. Acho que o caso de Mumia foi um caso político desde o começo, e tem continuado a ser um caso político, e agora ele tem conseguido muitíssimo apoio. É o único ex membro do Partido Black Panters que está no corredor da morte nos Estados Unidos; é o único jornalista radial que está no corredor da morte nos Estados Unidos. É autor de três livros, tem grau de máster da Universidade de Califórnia, orador de cerimónias de graduações. É um homem que tem escrito centenas de artigos, já publicados, e não há dúvida de que é um caso político relevante.

Randy Alonso.- Sublinho-o, porque para quem temos estado participando durante estes meses nestas mesas redondas, em várias ocasiões temos dito que o caso de Elián se tem tornado também um caso político nas cortes norte-americanas e, evidentemente, tem antecedentes. Eu acho que resulta importante que sublinhemos este tema.

Mas você, Leonard, fazia referëncia ao movimento de solidariedade que tem surgido com o caso de Mumia. Pam é coordenadora de uma das organizações que tem originado, que tem apoiado esse movimento de solidariedade.

Em sua opinião, Pam, que importância tem tido, como se tem organizado esse movimento de solidariedade com o caso de Mumia?

Pam Africa.- Esse movimento de solidariedade começou em Filadélfia e se espalhou pelo mundo. Pessoas como o presidente Jacques Chirac, da França, os sindicatos..., e no dia 24 de Abril, no dia do comício "Milhões de pessoas em favor de Mumia", na costa ocidental, os sindicatos bloqueram toda a área de embarque em nome de Mumia, e há participação do sindicato, dos estudantes que têm desafiado o governo, para tentar de evitar que se falasse em contra de Mumia. Estava a associação Nacional de Polícias Negros, que afirmava que tinha investigado o caso e encontraram que Mumia merecia outro julgamento; acusaram um governo em que os sindicatos estagnaram toda a costa ocidental. Quando há presidentes, quando há prefeitos, o prefeito de San Francisco que põe em perigo seu posto e declara que não houve um julgamento justo para Mumia, e exigem um julgamento justo; quando há pessoas que se lançam às ruas, enquanto se celebra a Convenção de Governadores, em 1995, justamente depois que o governador Ridge assinasse a sentença de morte de Abu-Jamal, e quando há negros, brancos, pessoas da alta sociedade que vão e se manifestam na Convenção de Governadores, sabíamos que nos enfrentávamos à CIA, ao FBI, a todo tipo de pessoas que estão no poder com armas, que não hesitariam em empregá-las contra nós. Quando estas pessoas foram à procura do governadorm interromperam logo a convenção.

Também em San Francisco, onde o Presidente esteve, milhares de pessoas se lanzaram às ruas e houve protestos em favor de Mumia, e quando se soube que o Presidente se encontrava a alguns quarteirões de distância, foram para ali a protestar. Quando há estudantes universitários que também se lançaram à rua e têm sido brutalmente espancados e encerrados e o movimento continua crescendo cada vez mais, o desejo de Mumia sempre tem sido expor a injustiça, e é exatamente o que tem feito. Ele tem expressado não só a injustiça da polícia de Filadélfia, mas toda a brutalidade dos Estados Unidos da América. Isto tem sido exposto ante o mundo. O movimento realmente é imenso.

Rosemari Mealy.- Não devemos esquecer que antes de que Mumia fosse preso, já ele tinha começado a investigar em Filadélfia a corrução dentro da polícia, e começavam a escutar-se seus comentários nas estações de rádio..., que por vezes o governo federal tinha que ir a Filadélfia e investigar à polícia. De tal maneira que –como muitos advogados aqui sabem-, as pessoas condenadas pelos tribunais foram libertadas. Contudo, também a Mumia lhe proibiram fazer comentários na rádio pública devido ao poder de sua voz e da sua caneta. Ainda estando no corredor da morte, se ve ainda como uma ameaça, e seu último livro, All Things Censored (Todas as Coisas Censuradas), visto que os comentários que ele organizou para a rádio pública e através dos esforços da Ordem Fraternal da Polícia, que é a organização que representa à polícia nacionalmente, eles não queriam que esses comentários aparecessem pela rádio. Portanto, como jornalista estelar, como jornalista que tem recebido prêmios, ele constitui uma ameaça muito séria.

Pam Africa.- Em seus livros ele expõe não só o ataque contra os negros, mas o ataque aos funcionários negros, os congressistas, esposas, etc., que alimentavam os pobres, os que nada têm, que em Filadélfia viviam no metrô, debaixo da terra, que eram atacados pela polícia. Falava-se das desvantagens de ser pobre, os espancamentos que lhes davam aos pobres.

Mumia, desde seu corredor da morte, escreveu nesse sentido, e sobre a mulher de um senador que, indo em seu automóvel, foi detida e os policiais bateram nas janelas de seu carro. De novo Mumia expôs a corrupção; nesses livros aparece, para que o mundo conheça essa corrução, e também o assassinato de reus dentro dos cárceres.

Não vetaram os livros de Mumia por isso. Quando falam de vetar seus livros não dizem que o fazem porque mentiu a respeito da corrupção que existe no sistema; vetam os livros para que ele não possa expor a verdade. Mas nunca foi acusado de mentir.

Randy Alonso.- Neste movimento solidário de que vocês falavam, também as organizações cubanas têm estado ativas: a União Nacional de Escritores e Artistas de Cuba (UNEAC), a União de Jornalistas de Cuba (UPEC), o Instituto Cubano de Amizade com os Povos (ICAP) e a União Nacional de Jurista, têm emitido declarações em vários momentos pela libertação de Abu-Jamal, e também o fizeram várias organizações internacionais que estão sediadas em Havana, como a Organização Continental Latino-americana e Caribenha de Estudantes (OCLAE) e a Organização de Solidariedade com os Povos de Ásia, África e América Latina (OSPAAAL), alguns de cujos representantes nos acompanham hoje como convidados nesta mesa redonda.

Há um dado do qual falávamos do caso específico de Filadélfia. Cá tenho uma informação que diz que enquanto só 9% da população total de Pensilvânia é afro-americana, a percentagem de condenados a morte é quase sete vezes essa cifra, isto é, 62%, o que é considerado o maior indicador de disparidade racial existente num estado. Por outra parte, um estudo de 1998, na Universidade de Iowa, revela que um jovem que desenvolva sua vida em Filadélfia é 11,5 vezes mais propenso a acabar entre os condenados a morte que em Georgia, Alabama e outros estados do sul, onde a população é maioritariamente negra. Nesse contexto aconteceu e continua latente o caso de Mumia Abu-Jamal.

Informam-me que agora temos um contacto telefônico em nosso centro internacional. Ali o jornalista Miguel Angel Masjuán conseguiu estabelecer contacto com Jeff Mackler, que dirige uma das coligações de solidariedade com Mumia Abu-Jamal.

Avante, Masjuán.

Miguel Angel Masjuán.- Muito bem, temos na linha a Jeff Mackler, que é o diretor da organização Movilização para a Libertação de Mumia Abu-Jamal e um dos coordenadores nacionais para sua defesa. Temos contacto com ele, já falamos um bocado e agora ele vai nos transmitir suas impresões sobre os últimos acontecimentos.

Senhor Mackler, como vai você hoje?

Jeff Mackler.- Vou bem, obrigado.

Miguel A. Masjuán.- Para mim é um prazer estabelecer contacto consigo. O quê pode nos dizer sobre Mumia e os últimos acontecimentos?

Jeff Mackler.- Ora bom, na Segunda-feira, 12 de Junho, fui visitar Mumia e devo dizer que seu espírito está muito alto. Ele tem estado acompanhando bem de perto o debate nacional que se abriu nos Estados Unidos sobre o seu caso e a pena de morte, porque ficou bem claro, agora que há muitas pessoas inocentes que serão executadas pelo chamado sistema de de justiça penal dos Estados Unidos.

Mumia está muito preocupado pela vida de Gary Graham, cujo nome africano é Shaka Sankofa, cuja execução está prevista para o dia 22 de Junho. Gary Graham é inocente. Há sete testemunhas visuais que podem provar que ele não pôde ter morto à pessoa de cuja morte é acusado, mas existe uma lei que proibe a apresentação desta informação, visto que passaram 30 dias depois da condenação de Gary e Gary tem estado na cadeia por mais de 20 anos.

Mumia é uma pessoa impresionante. Ele tem estado acompanhando os debates sobre o carácter reacionário do sistema judiciário dos Estados Unidos. Tem estado acompanhando as ações de massas e as demonstrações de toda uma geração que luta pelos direitos humanos e democráticos nos Estados Unidos.

Tem encabeçado a luta contra a execução das 3 600 pessoas que se encontram na lista da morte nos Estados unidos. Tem aproveitado o melhor possível sua vida no cárcere; lê todo tipo de livros, história, literatura, e á claro, falamos-lhe deste programa televisivo de Cuba e ficou muito contente e me pediu que transmitisse ao povo de Cuba suas saudações, pela sua luta pelos direitos democráticos e humanos.

Vocês sabem que Mumia, logicamente, como muitas pessoas nos Estados Unidos, está do lado de Elián e de seu pai, pelo seu retorno imediato a Cuba.

Nestes momentos há milhares de pessoas se manifestando em favor de Mumia. Ontem, tivemos uma concentração sob teto chamada Bring Back Mumia (Trazer Mumia de volta), onde assistiram 6 000 pessoas e foram arrecadados milhares de dólares de fundo para sua causa.

Ele tem estado muito interessado na luta revolucionária e na luta dos direitos humanos. O Comitê para sua defesa tem travado a cabo uma grande batalha para salvar a vida da pessoa que se encontra no perigo mais imediato de execução, literalmente, dentro de dias; Gary Graham.

Mumia tem encabeçado a luta pela salvação de sua vida, e seus seguidores se uniram a essa luta.

Estivemos durante duas horas debatendo de tudo, sobre literatura, sobr toda a luta que em todo o mundo se realiza, e por proeminentes norte-americanos, em prol de sua causa. Há muitas pessoas que se aderiram à luta por sua liberdade. É uma pessoa única, que tem estado numa cadeia isolado, 23 horas por dia, nos últimos anos de prissão, e tem criticado a hipocrisia do sistema judiciário dos Estados Unidos.

Temos falado sobre aquilo que faríamos quando consigamos tirá-lo do cárcere, e disse que lhe gostaria sair a caminhar duas horas, jantar e visitar Cuba. Portanto, acho que devem se preparar para receber Mumia em seu país, quando ele for um homem livre, e compartilhar com ele a liberdade que o povo de Cuba tem ganho a tão alto preço.

Miguel A. Masjuán.- Muito obrigado por sua cooperação. Você sabe que nestes momentos em Cuba um programa especial sobre ele, e esperamos que sua liberdade seja concedida logo que for possível.

Muito obrigado, Jeff.

Jeff Mackler.- Obrigado.

Miguel A. Masjuán.- E nós voltamos à nossa mesa redonda depois de ter ouvido a Jeff Mackler.

Randy Alonso.- Ouviram estas declarações telefônicas. Falávamos de cómo o fator racial continua coartando a justiça nos Estados Unidos, mas isso não acontece apenas em Finlândia, temos aqui um relatório da CNN em espanhol, que está enviado desde Houston, e diz:

"Pelo menos nove homens foram condenados a morte em Texas, seguindo as recomendações de um psicólogo, baseadas na raça dos acusados, segundo um relatório judiciário, que a atrai de novo a atenção sobre a aplicação da pena capital nesse estado norte-americano.

"A condenação a morte que motivou a investigação foi revogada na Segunda-feira pela Corte Suprema dos Estados Unidos" –ou seja, na Segunda-feira da semana passada. "O psicólogo Walter Quijano tinha declarado que o trabalhador argentino Víctor Hugo Saldaño, condenado por assassinato era um perigo futuro para a sociedade, devido a sua origem hispana.

"Texas tem executado 218 pessoas desde 1982; muitas mais do que qualquer outro estado da união americana."

Falávamos de que Mumia não era o único inocente que tinha sido condenado à pena de morte, também o é em Texas, precisamente, o afro-americano Shaka Sankofa, de quem nos acabou de falar Mackler em sua chamada telefônica.

Sankofa tem sido condenado injustamente e acusado de matar um homem branco, e lhe foi fixada a data de execução para os próximos três dias, no próximo 22 de Junho.

Estas são algumas das declarações que recentemente tem feito Shaka e parte de sua família, que nós lhes queremos apresentar em um breve vídeo que temos:

Advogado.- Não há dúvidas de que Gary Graham pode morrer por um ato que ele não cometeu.

Familiar.- Eles podem estar enganados.

Familiar.- Se não tens dinheiro, não há justiça.

Familiar.- Aguém tem que fazer alguma coisa.

Familiar.- Se houvesse justiça as coisas seriam diferentes.

James Dixon.- A questão que se põe é se Gary Graham foi condenado como resultado de um fato e por um julgamento equitativo. Conforme esse affidávit errado, o pesquisador contratado em seu nome, segundo Gary Graham, não recebeu um julgamento justo.

Oiçam isto: Eu me lembro que desde o primeiro momento o procurador disse que Gary Graham era culpado e isso afectou minha investigação. Isto pode ser injusto, mas assim foi como aconteceu.

Doug O Brien.- Agora, escutem. Esta equipe, de tipo legal, agiu por sua conta; todo o sistema judiciário depende dos procuradores e seu trabalho que consiste em investigar todos os casos e representar seus clientes o melhor possível.

Chester Thorton.- É uma prova real da declaração que fez no affidávit.

Gary Graham.- E que não me preocupa tanto. Naqueles momentos não me preocupou tanto porque haviam outros roubos e, basicamente, como foi dito, supôs-se que eu era o culpável do roubo e, portanto, que também era culpado do assassinato.

Doug O Brien.- O direito de confrontação e de interrogatório é um dos conceitos mais importantes dentro de nosso país e, por conseguinte, isto foi aproveitado no julgamento e a partir disso, qualquer pessoa poderia ser condenada a morte por fatos que não cometeu.

Dennis Graham.- Em seu nome, os advogados dele não agiram, nem a testemunha principal. Segundo o que eles manifestaram, não houve outra alternativa do que declará-lo culpado.

Randy Alonso.- Estas foram declarações de Shaka Sankofa e outras pessoas próximas do caso.

Quero esclarecer-lhes aos nossos telespectadores que Shaka também tem o nome de Gary Graham, é por isso que indistintamente ouvirão, em um momento ou outro, o nome de uma forma ou da outra.

Cá temos a Gloria Rubac, que tem sido uma grande ativista do movimento de solidariedade com Shaka Sankofa em Texas e também tem trabalhado todo o tema dos cárceres, da pena de morte neste estado que –como dizíamos- é o que tem executado mais pessoas nos últimos anos nos Estados Unidos.

Gloria, gostaria que nos fizesse uam referência breve do caso de Shaka; como ele vai, em quê estado se encontra, porque dizíamos daqui a três dias deve ser executado; que esforços foram envidados, como está o movimento de solidariedade, e quê outros elementos sobre Texas nos poderia oferecer.

Gloria Rubac.- Antes do mais, para falar sobre o caso de Shaka, realmente fiquei muito surpreendida pelo que disse Leonard acerca de Mumia, porque há muitas questões semelhantes.

Shaka foi apreendido quando tinha 17 anos de idade e, segundo muitas leis internacionais, isto não deve acontecer entre os jovens, os jovens não devem ser condenados a morte; mas isto aontece nos Estados Unidos.

Houve sete testemunhas do assassinato da vítima que supostamente foi morta por Shaka, porém não foi chamada nenhuma delas para que apresentasse suas provas. Shaka foi defendido por um advogado de ofício incompetente, naqueles momentos já tinha enviado a mais de uma dúzia de pessoas para o corredor da morte em Texas. Constatamos que no vídeo foi dito: "Não investiguem o caso porque de resto este homem é culpável."

No caso de Shaka não existiam provas, apenas uma mulher que disse que ele tinha sido o assassino. Não tinha sangue, não tinha vestígios, não tinha uma confissão, não tinha um cabelo, nada que indigitasse que ele era que tinha cometido o crime. Das sete testemunhas oculares, ela era a pessoa que se encontrava mais afastada do lugar do crime, e diz que viu ele durante três ou quatro segundos. Outras pessoas viram sim, o crime, viram quem o cometeu e houve alguns que estiveram até 15 minutos e até 30 minutos no mercado, no lugar do crime.

Shaka é de Houston, Texas, que é o condado de Harris. Houston tem executado tantas pessoas, que se fosse um estado, seria o terceiro, depois de Texas e Virgínia, com o maior número de execuções feitas entre os diferentes estados, se o consideramos como tal.

O procurador de Texas –e aqui se falou de política- sente-se muito orgulhoso de seu histórico de execuções, e a raça e a classe ocupam um lugar principal. O procurador do distrito, geralmente não acusa nem julga ninguém que mereça a pena capital, se essas pessoas possuem seus próprios advogados; mas Shaka, como 90% das pessoas que se encontram no corredor da morte nos Estados Unidos, tem um advogado de ofício. Procedia de uma família pobre, acho que uma coisa muito triste e lamentável, típico das pessoas que se encontram no corredor da morte. Sua mãe tinha um problema psiquiátrico, seu pai era alcoólico e aos 17 anos teve dois filhos e viveu um bocado pela sua conta durante a maior parte de sua vida. Contudo, depois de 19 anos no corredor da morte, tenho que dizer que Shaka é uma pessoa diferente, tem se tornado numa pessoa cuja consciência política tem acordado, e se tem convertido num revolucionário. Por essas razões, o estado de Texas quer executá-lo, mas também por essas razões, como Mumia, fez com que se levantasse este movimento de apoio no mundo todo.

A 19 de Junho se comemora o aniversário da execução dos Rosemberg; mas esta data, 19 de Junho, também foi a data em que lhes foi outorgada a liberdade aos escravos em Texas e, realmente, passaram dois anos depois do fim da Guerra Civil, antes de que se tornasse efectiva. Desde essa altura essa data vem sendo comemorada. De tal maneira que, neste fim-de-semana houve muitas comemorações em Texas, por ocasião do 19 de Junho.

Mas também foram feitos protestos pela iminente execução de Gary Graham, Shaka Sankofa, execução que será realizada daqui a três dias.

Os republicanos de Texas estavam realizando sua Convenção, em Houston, e houve protestos todos os dias fora do local em que se celebra a Convenção, e de fato nosso grupo participa no desfile do dia 19 de Julho. Também distribuímos 5 000 cartazes com uma foto de Gary Graham sorrindo quando era menor no cárcere, antes de ir para o corredor da morte, que foram distribuídos no centro de Houston.

O movimento para salvar Shaka cresce cada dia, como cresce o movimento contra a pena capital.

Já vimos que deste tema se tem falado na CNN, na revista Newsweek, e os mídias nos Estados Unidos debatem a pena de morte e focam Texas, visto que Texas é a capital mundial das execuções.

George W. Bush executou 133 pessoas durante seus cinco anos como governador, e este tem sido um recorde que não tem sido igualado num período de 100 anos. Quer dizer, temos um problema grave em Texas, onde foram executadas 230 pessoas, mas afortunadamente as pessoas não reparam apenas nos inocentes que estão no corredor da morte, pessoas iguais a Shaka, mas também naquelas que pudessem ser culpadas, que ainda não tiveram um julgamento justo, que não têm tido dinheiro para o pagamento de uma defesa; nem tinham dinheiro, e agora vemos, segundo a CNN, que quando uma pessoa é latina ou afro-americana, isto também tem sido utilizado para condená-la a morte, porque esse perito disse que uma das perguntas a responder em Texas para ser condenado a morte é se essa pessoa vai ser um perigo no futuro, e resulta que Texas utiliza peritos para que digam se essas pessoas podem ser um perigo no futuro porque são latinas, ou porque são afro-americanas. Este racismo está invadindo todo o sistema no que diz respeito à pena capital.

Víctor Saldaño, de Argentina, não é o único e, felizmente, sua sentença foi revogada, e não foi tomado em conta este falso testemunho.

No país, uma de cada 10 pessoas no cárcere se encontra em Texas, não só no corredor da morte onde há 460 pessoas, há mais de 150 000 pessoas na cadeia. A maioria dos que estão no corredor da morte e a maioria dos que estão na prisão são negros.

No caso de Gray, não é só pela lei de Texas, mas também pela lei aprovada por Clinton em 1996, que evita que sejam apresentadas novas evidências no caso de Shaka.

Temos continuado à procura de novas provas no caso de Shaka, e em 1993 seus advogados –bom, finalmente conseguiu bons advogados, alguns deles dos melhores- têm dedicado centenas de horas à investigação. Então, nesta pesquisa com as seis testemunhas oculares surgiram muitas provas que demonstram que é inocente. Em 1993, apresentou-se na corte federal e tinha provas suficientes para o declarar inocente; mas se tem dito: Bom, é preciso concluir no tribunal do estado e depois passar para o tribunal federal. O tribunal estadual o rejeitou.

Em 1996 o caso foi levado mais uma vez ao tribunal federal, mas já Clinton tinha promulgado a nova lei desse ano, a lei anti-terrorismo e de pena de morte efectiva, e os tribunais disseram que não podiam trabalhar com o caso agora, portanto, nenhum tribunal conseguiu escutar as novas provas, nem conseguiu escutar as seis testemunhas novas, que dão uma descrição semelhante do assassino, descrição que nada tem a ver com Shaka Sankofa. É realmente uma coisa muito desafortunada.

Então a única opção legal pendente é que na passada Quarta-feira seus advogados apresentaram um recurso original de habeas corpus perante o Supremo Tribunal dos Estados Unidos da América. Isto não se faz com muita freqüência, na última ocasião se obteve uma decisão favorável com habeas corpus; isso foi nos anos vinte. Esta é sua única opção legal; contudo, com este recurso de habeas corpus a vida de Sankofa está nas mãos de George W. Bush, que é conhecido como o Governador da Morte, e a junta de indulto e liberdade condicional, cujos membros foram nomeados por Bush e que lhe podem outorgar ora a clemência, ora uma clemência condicional, ora dizer ao contrário: Bom, analisamos as evidências e novas provas e concluímos que não es culpado.

Seus advogados pedem clemência condicional. Esperamos que isto aconteça antes da Quinta-feira.

O movimento é muito forte, e Shaka também é muito forte. Ele sabe, como também o sabe Mumia, que sua vida está nas mãos destas pessoas, e hoje há manifestações. Nestes momentos há um movimento de carácter internacional. Bush estará em Palo Alto, Califórnia, e lá farão manifestações. Somos muito otimistas, pensamos que vão libertar Shaka, e isto poderia ser o começo do fim da pena de morte.

Randy Alonso.- Esse é um outro exemplo das injustiças do sistema norte-americano. Um exemplo bastante próximo, porque estamos falando de uma pessoa que pode ser executada dentro de poucas horas e, como você disse, a revista Newsweek deste 12 de Junho lhe dedicou uma importante parte da revista ao tema da pena de morte nos Estados Unidos da América, e diz: "Repensando na pena de morte", a partir dos artigos, a partir dos estudos que foram feitos sobre este tema nos Estados Unidos, e também tenho um telex da CNN no seu serviço interativo, que diz que um estudo afirma que o sistema de pena capital nos Estados Unidos está cheio de erros, tendo em conta o número de apelações apresentadas a condenas desse tipo.

"O estudo da Universidade de Columbia, Nova Iorque, encontra que as apelações tiveram sucessos nas duas terceiras partes dos casos, tomados como exemplo, acontecidos desde 1973 até 1995", isto é, que nas duas terceiras partes dos condenados à pena capital foram revogadas essas condenas por ter-se cometido erros durante o processo.

"O principal autor do estudo, James Liebman, disse que a maioria dos casos estavam tão mal estruturados que tiveram que ser retomados. Basedo nisto, o estudo indica que o sistema da pena de morte é insustentável nos Estados Unidos, fundamentalmente pelos erros que levam a essa pena em varios dos casos."

Temos no telefone a uma outra personalidade dos Estados Unidos, que gostaria participar hoje na nossa mesa redonda.

Miguel Angel Masjuán tem ao telefone o conhecido ator norte-americano Danny Glover, que tem sido participante ativo de todo este movimento em defesa de Mumia e também de Shaka, e gostaria fazer declarações telefónicas para a nossa mesa redonda de hoje.

Miguel A. Masjuán.- Temos ao telefone a Danny Glover, conhecido ator, e vamos falar na mesa redonda o que se sabe hoje sobre Shaka Sankofa, isto é, os últimos acontecimentos, e também sobre Mumia Abu-Jamal.

Senhor Glover, é um prazer tê-lo ao telefone, e gostariamos ouvir as vossas impressões sobre os últimos acontecimentos sobre Shaka Sankofa e Abu-Jamal.

Danny Glover.- Bom, para mim é um prazer participar neste painel e poder falar com o povo cubano sobre a situação aqui no relativo a Shaka Sankofa e Jamal, casos em que trabalhei —o caso de Sankofa— durante sete anos.

Há sete anos trabalho neste caso, e encontra-se na lista de morte há 19 anos, portanto está chegando a hora de sua execução que será a próxima quinta-feira 22 de Junho. Neste momento estamos fazendo tudo o possível para deter este procedimento.

Desde o início houve uma testemunha apenas e supõe-se que tenha identificado Shaka Sankofa. O que nós pedimos é a apresentação doutras evidências, outras provas que possam provar sua inocência, e isto não nos foi concedido, não nos deram a oportunidade de o fazer.. Esperamos que o sistema judiciário, esperamos inclusive que a influência do governador Bush possa dar-nos essa oportunidade.

Ele declarou sua inocência, há 19 anos que está nesse processo e o advogado que teve desde o início e durante o julgamento tem sido inadequado.

Quer dizer que estamos, na verdade, num momento muito difícil. Estamos fazendo tudo o que podemos.

Miguel A. Masjuán.- Temos a certeza de que o vão conseguir, que vão ter sucesso.

Danny Glover.- Com certeza. Estamos confiados em que vamos manter nossa luta, estamos confiados en que Sankofa é inocente.

O sistema aqui é muito eficiente em suas execuções, como uma máquina da morte, é uma coisa que vimos antes, mas estamos confiados que temos feito tudo o possível: temos organizado, mobilizado a muitas pessoas e achamos que podemos levar esta luta à conciência dos norte-americanos, e esperamos alcançar a vitória.

Miguel A. Masjuán.- Muito obrigado, senhor Glover, foi um prazer falar com você e agradecemos a sua cooperação. Dentro em breve contataremos com você.

Obrigado.

Acabamos de escutar ao ator Danny Glover desde Nova Iorque nas suas considerações sobre o caso de Shaka Sankofa que será executado daqui a pouco segundo as lei norte-americana, e nós voltamos a nossa mesa redonda.

Randy Alonso.- Obrigado Masjuán, por este contato com o famoso ator Danny Glover, e também por ter podido escutar seus argumentos e opiniões sobre o caso de Shaka Sankofa.

Na preparação desta mesa redonda tive a oportunidade de ler Criminal Injustice, um livro que contém muitíssimos dados sobre a situação dos cárceres norte-americanos e das injustiças cometidas no sistema penal desse país, e uma das coisas que diz é que os Estados Unidos tem um dos mais altos níveis de encarceramento da população do mundo: aproximadamente 519 pessoas por cada 100 000 habitantes estão presos nos Estados Unidos; mas entretanto os homens afro-americanos representam 6% da população dos Estados Unidos
--segundo estudos de 1996--, constituem por volta de 50% dos prisioneiros deste país. Isto é, que se a taxa no país é de 519 por 100 000, a taxa de homens afro-americanos é de 3 822 por 100 000.

Convidamos à mesa redonda ao Doutor Lennox, um advogado de muito prestígio em seu país e que tem defendido em vários momentos prisioneiros políticos e teve casos importantes neste movimento de defesa dos afro-americanos.

Gostaria perguntar-lhe, Professor Lennox, sua opinião em que grau avalia você o racismo que tem lugar no sistema penal americano, as arbitrariedades que são feitas e que informação nos pudesse oferecer sobre a situação dos prisioneiros políticos nos Estados Unidos hoje.

Lennox Hinds.- No caso de Mumia Abu-Jamal, na verdade, vemos a alguem que constitui um exemplo da aplicação da lei na sua forma racista e política.

Nos Estados Unidos a lei é utilizada como um mecanismo de controle e em muitas situações há uma percepção da justiça que leva a confusão a muitas pessoas; contudo, o governo apresenta isto perante o mundo como se eles fossem os campiões da lei e os campiões dos direitos humanos. Mas desde o formação dos Estados Unidos da América e no que constitui o aparecimento do país, evidencia-se o racismo, a partir da Constituição dos Estados Unidos e do pré-âmbulo dela, onde os chamados próceres adoptaram uma posição hipócrita no que se refere à terra roubada à população indígena, todos os escravagistas; George Washington, Benjamín Franklin, Jefferson, todos os próceres foram muito hipócritas empregando a lei como um escudo —por dizê-lo dalguma maneira—para pôr em prática seu racismo.

De tal maneira que quando vemos como funciona a lei na atualidade, há que ver de uma forma restrospectiva a hipocrisia da lei, e Mumia Abu-Jamal é apenas um destes exemplos, como o caso de Shaka; são vítimas do uso do racismo, é a forma de aplicar a lei no relativo ao racismo.

Em 1976 apresentamos uma moção perante as Nações Unidas sobre a prevenção da discriminação e a proteção às minorias. Eis uma cópia dessa demanda. Essa demanda, com seus anexos, mostra que o governo dos Estados Unidos ao administrar a justiça viola os direitos das minorias nacionais, não só afro-americanos, mas também os latinos, os indígenas e os asiáticos-americanos.

Não há dúvida nenhuma, quando é examinado o funcionamento da lei, pode-se constatar, por exemplo, que as pessoas que estão no cárcere, na sua grande maioria, são pobres; e se for analisado os Estados Unidos geográficamentecomo um todo, podem observar que no nordeste há negros e porto-riquenhos; se observarem o sudeste, isto é, Arizona, Novo México, poderiam ver que a maioria são chicanos; ao passo que, no estado de Minnesota onde há uma percentagem de indígenas, na parte urbana se encontra a percentagem mais alta destes indígenas no cárcere. De tal maneira que o argumento não pode ser que todas estas minorias nacionais são criminosos. É a criminalização baseada na cor da pele o que está na prática.

De tal maneira que ao observar o caso de Mumia, não só com respeito à raça, mas também com respeito à política, porque assim é como pode ser visto, poque ele foi vítima do programa de contra-inteligência de FBI, e vocês ouviram dos outros membros do painel as opiniões relativas às questões do Partido Black Panters .

Rosemari Mealy falou da perseguição ao Partido Black Panters .

Em 1967 houve um programa de J. Edgar Hoover, onde, segundo ele, os que lutavam contra sua condição de oprimidos nos Estados Unidos deviam ser identificados e destruídos; mas eles não se concentraram apenas no Partido Black Panters , mas em pessoas como por exemplo, Harry Belafonte, Martin Luther King, Earth Kid.Por exemplo como Sammy Davis Jr; ninguém poderia pensar que Sammy Davys Jr. É perigoso, contudo, eles eram consideradas pessoas perigosas que tinham que estar sob vigia, e no caso de pertencerem ao Partido Black Panters eram perseguidos por assassínios.

E vocês já viram o efeito disto, foram presos políticos dentro dos Estados Unidos: por exemplo, pessoas como Peltier, membro do Movimento Indígena dos Estados Unidos, está na cadeia há mais de 25 anos. Sundiata Acoli, que era membro do Partido Black Panters , há 27 anos está na cadeia; Mondo We Langa e Ed Poindexter, também está na cadeia há mais de 30 anos; Seku Odinga, na cadeia há 20 anos; Mutulu Shakur, e posso continuar com uma lista interminável. Os Estados Unidos nega que são prisioneiros políticos no país, mas as evidências são claras, esses são prisioneiros políticos e existem.

Se também analisamos o caso de Mumia, ele foi vítima de um crime policial. A polícia nos Estados Unidos são os únicos trabalhadores do governo que têm o poder e a autoridade de utilizar a força para obrigar os cidadãos a obedecerem, inclusive uma força mortal, e é empregando esta força mortal que se observam membros de comunidades minoritárias vítimas da polícia. E isso não só acontece em Nova Iorque, mas também noutras partes, e constitui um exemplo destas expressões.

É através dos Estados Unidos que acontece isto, e não é um fenômeno novo. Se se remetem a 1968, o relatório da Comissão Kerner, nos seus resultados, colocou que a polícia constitui e representa um instrumento de repressão para as comunidades minoritárias; nas comunidades brancas a polícia vê-se como pessoas que ajudam a cruçar a rua às crianças, de vez quando lhes oferecem rebuçados, e em comunidades de minorias eles são os que disparam, são os que batem com a bengala na cabeça de alguem e colocam os pés nos pescosos das minorias. Essa é a diferença, é a diferença da realidade da vida nos Estados Unidos.

Para acabar gostaria dizer alguma coisa sobre a pena de morte.

A pena de morte da que quero falar viola o Acordo Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, é uma violação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, viola a Convenção Internacional em contra da discriminação racial. Todos estes instrumentos que foram assinados e ratificados pelos Estados Unidos da América são violados.

No caso de Shaka Sankofa, foi detido aos 17 anos por um crime, que segundo o que foi dito, foi cometido nesse momento. É o uso da pena de morte para matar as nossas crianças, matar os nossos jovens, que é o mais terrível, porque mais uma vez, se for analisada a história dos Estados Unidos, há 38 estados que têm estabelecida a pena de morte, 13 deles não têm idade mínima a partir da qual pode ser aplicada essa lei numa pessoa na base de ter cometido esta ofensa. Dez estados dizem que a idade mínima é de 18; 14 estados dizem que a idade é de 13 a 17 años e quando vemos quem foram condenados à pena de morte constatamos que as duas crianças mais jovens executadas nos Estados Unidos tinham 10 anos, um negro e um indígena, em 1855 e 1857 respectivamente.

Leonard já lhes falou de estatísticas com respeito a que 18 de 3 600 pessoas são executadas. Não houve nenhum homem branco na história dos Estados Unidos executado por ter violado a uma mulher negra; contudo, quando a violação foi considerada pena capital, das 455 pessoas que foram executadas por crime de violação, 405 eram negros. Por conseguinte há que analisar a lei e há que ver a hipocrisia do uso da lei e a ilusão da justiça sob a lei, como foi manifestada nos Estados Unidos ao anlisar estos casos.

Randy Alonso.- Muito obrigado. Acho que foi uma explicação muito ampla e muito concreta de um grupo de casos e um grupo de elementos que nos indicam o nível de discriminação e o nível de injustiça que está submetida hoje a sociedade americana; a forma em que são discriminados os negros, os latinos, os chicanos, os indígenas americanos pela cor da pele e também pelo seu nível de pobreza ou riqueza dentro dessa sociedade.

Mas há um bocado que falávamos de Texas; e junto de Texas, Nova Iorque e também a Flórida, Califórnia é um dos estados de maior índice de criminalidade nos Estados Unidos, e é também um dos estados onde mais se restinge a justiça desse país.

Gloria vem daí, da Califórnia, e gostaria perguntar-lhe o quê nos poderia comentar sobre a situação da justiça desse estado norte-americano.

Gloria La Riva.- Seria muitio difícil dizer qual seria o estado mais repressivo dos que você mencionou, isto é Califórnia, Texas, Virgínia, Nova Iorque ou Pensilvánia; mas califórnia tem uma população de 32 milhões de habitantes, a maior de todas, e também tem o sistema penitenciário maior do mundo. Há mais de 188 000 pessoas no cárcere de Califórnia.

Lennox e outros dos membros de painel falaram do problema da raça, que é um dos fatores fundamentais, e apesar de que 60% das violações, dos assaltos e assassinatos são feitos por homens brancos em Califórnia, o nível de encarceramento para os negros é dezassete vezes maior que no caso dos homens brancos. Por isso há uma percentagem muito alta de afro-americanos e latinos em Califórnia, que se encontram presos.

Califórnia tem sido um estado onde se realizaram muitas experiências e primeiras aplicações. Por exemplo, a lei das três condenas, uma lei que estabelece que uma terceira condena, que pode ser um crime não violento ou um crime grave, pode manter a uma pessoa na cadeia para toda a vida, sem possibilidades de sair em liberdade condicional, isto fez com que a população penal tenha aumentado. Também existem cárceres de alta segurança, que são chamados unidades de controle; existem por todo o país, como por exemplo: em Califórnia há um chamado Pelican Bay. É um cárcere que se encontra na parte norte do estado e 55% dos presos lá são chicanos e outros latinos; 55%, a maioria deles vêm de Los Ángeles, porque são considerados bandidos.

É interessante analisar Los Ángeles, California, porque em Los Ángeles o Departamento da Polícia tem realizado um assalto imenso aos latinos e aos negros porque nos registros policiais foram identificados 112 000 latinos como bandidos. Se a polícia o detem, você pode ser identificado como um bandidos com outros amigos. É por isso que muitos deles se encontram no cárcere de Pelican Bay, onde se encontram confinados em solitário.

Presentemente, em Califórnia, Los Ángeles, houve um grande escândalo no Departamento de Polícia, porque resulta que depois da confissão de vários polícias soube-se de vários milhares de pessoas que se encontram no cárcere, sobretudo latinos e afro-americanos, tinham sido condenados injustamente, sobretudo porque se tinha exercido pressão nas testemunhas, porque se tinha implantado evidências, drogas por parte da polícia contra jovens.

Temos o caso que abriu o escândalo, um jovem latino de 20 anos aproximadamente, Javier Francisco Ovando, quem recebeu um disparo de um polícia latino, que foi surpreso com 8 libras de cocaína, estava vendendo a cocaína que lhe tirara a um acusado, e decidiram vigiar esse homem, esse latino, e uma noite quando foram apreendê-lo —e estamos falando da confissão de um polícia— dispararam-lhe na cabeça, caiu, recolheram-no e mais uma vez lhe dispararam no peito; e imediatamete que conseguiu estabilizar-se no hospital, trouxeram-no numa maca para a sala do tribunal penal e foi acusado de tentativa de assassinato, embora este homem não fizera nada; ele simplesmente foi identificado na rua de bandido, e foi acusado de tentativa de assassinato. Foi condenado de ao redor de 20 anos para cadeia perpétua, e como o polícia foi surpreso com cocaína teve que confesar seu crime e muitos outros que cometera, e agora muitos polícias estão a ser julgados.

Depois este jovem foi entrevistado por jornais, há aproximadamente três meses; preguntaram-lhe: Quando você estava a ser julgado e a polícia o acusou falsamente de tentativa de assassinato, porque que não disse nada? E ele resondeu: Meus advogados me disseram que ninguém ia acreditar em mim. Que não me incomoda-se em contar minha história. E acontece que há muitos jovens que foram apreendidos pela polícia, e a polícia tem cometido muitos assassinatos. De tal maneira que temos uma polícia muito corrupta em Los Ángeles. Um cárcere no norte de Califórnia cheia de afro-americanos e latinos. Quem sabe quantas vidas foram arruinadas.

Gostaria colocar uma coisa muito brevemente. Nós os que estamos aqui, moramos no país mais rico do mundo, nos Estados Unidos. O estado mais rico nos Estados Unido é Califórnia , porque que é que há 2 milhões de presos nos Estados Unidos? Porque existe tanta pobreza? Não há excusa para que exista tanta pobreza nos Estados Unidos.

O nível de desemprego tem dimunuído um bocado, é aproximadamente de 5%; contudo, o preço médio de uma casa em San Francisco, Califórnia é de 460 000 dólares; se é um simples trabalhador não pode comprar uma casa, quase não se pode viver com os salários, embora tenha um emprego é quase impossível morar em Califórnia. Por isso é cada vez maior o número pessoas que recebem salários baixos e participam nos crimes de carácter econômico, e são considerados marginais porque são pobres; por conseguinte, os cárceres estão cheios dessas pessoas pobres. Algumas mulheres que se dedicam à prostituição vão para cadeia durante anos; chegam à drogadição; há muitos problemas socio-econômicos, como resultado do sistema econômico capitalista.

Por exemplo, temos o caso de Bill Gates, com essa fortuna pessoal de 100 000 milhões de dólares, que nem sequer poderia gastar 1 000 milhões de dólares em toda sua vida; contudo, tem dinheiro mais do que o suficiente para resolver todos os problemas econômicos dos pobres no nosso país. Mas ele é tão rico que tem empobrecido a estes pobres e emprega a presos que trabalham por centavos a hora para que fabriquem seus produtos para fazer com que Bill Gates seja um homem extremadamente rico. Nisso baseia-se a injustiça.

Randy Alonso.- Precisamente Califórnia foi cenário, no início desta década e na década passada também, de muitos fatos de violência policial, e lembremos sempre o caso de Rodney King.

Mas também é famoso em Nova Iorque, há pouco, o caso de Amadou Diallo. Rosemari esteve cobrindo esse acontecimento em Nova Iorque, sabe os pormenores desse fato e também nos pode falar da brutalidade policial, que é outro dos componentes do racismo na sociedade norte-americana, como se manifesta nese estado americano.

Rosemari Mealy.- Obrigada, Randy. O aumento da polarização social é uma tendência global. A polarização tem que ser vista como uma tendência global, e se o faz, vê que em Nova Iorque há um dos indicadores mais agudos neste sentido.

Esta realidade social da que falamos aqui está muito relacionada com o controle policial à classe operária em cada uma das cidades, comunidades, bairros, em todos os lugares em que moremos.

Meus comentários os começo com esta afirmação: analisar o que na verdade acontece com Amadou Diallo.

Amadou Diallo foi um jovem de 24 anos, emigrante da Guiné, África, e Amadou Diallo representa uma tendência, um fenômeno que vemos nos Estados Unidos, onde se tem essa mudança do processo da emigração.

Nas últimas duas décadas, mais de um milhão de imigrantes chegaram à cidades de Nova Iorque, de maneira que a situação é uma: a cidade tem empobrecido mais, é mais escura; e observamos aos residentes se têm envolvido no chamado —e faço citação— "a fuga de brancos", onde as massas de brancos abandonam a cidade porque não podem suportar o racismo. Isto é chamado o obscurecimento da América. As escolas estão superlotadas na cidade e temos falado da taxa de desemprego e do que temos aí.

Amadou Diallo viu-se nesta situação, onde há uma força policial na cidade de Nova Iorque que está formada por 38 000 polícias; 38 000 polícias na cidade de Nova Iorque e só 11,4% deles são negros e 13% são latinos.

O racismo entre os que constituem a maioria na polícia se manifesta no que se conhece como brutalidade policial.

A 4 de Fevereiro, quando foi assassinado Amadou —e na verdade foi executado a sangue frio—, supunha-se que era suspeito de uma situação de "violação". A polícia dirigiu-se a ele e lhe pediu que se identificasse, ele tentado identificar-se levantou sua carteira. Depois disso, recebeu disparos no corpo, que ficaram imortalizados nas palavras do músico Bruce Spingsteen, quem tem tentado refetir o que acontece na cidade, através da cultura como mecanismo de resposta.

Devido a que o Departamento Federal da Justiça dos Estados Unidos e a cidade de Nova Iorque já começaram uma investigação sobre a brutalidade policial na cidade há três anos, muitas desta atividades poderiam mudar a partir destes crimes contra os idosos, como por exemplo, o caso de Eleonor Bumpers. E vimos situações nas que eram assassinados latinos e muitos assassinatos eram cometidos pela polícia.

No caso de Amadou Diallo, houve um verdadeiro movimento exigindo justiça para ele.

Mais uma vez —como disse Lennox— a maneira de como sistema de tribunais é utilizado num sentido político e não é realizado o julgamento em Nova Iorque, onde se julgava um polícia que tinha assassinado a Amadou, mudou-se o lugar do julgamento. Foi deslocado para a parte norte de Nova Iorque. De tal maneira que foi um julgamento em que todos eram brancos, salvo uns poucos negros, quem julgaram realmente esses quatro polícias e os polícias foram exonerados de toda responsabilidade, de tal maneira que os que assassinaram a Diallo, bem como os outros que assassinaram a muitos negros em Nova Iorque, encontram-se em liberdade.

Esta situação que é experimentada na cidade e no país, cria uma situação em que a juventude se organiza contra a brutalidade policial, contra o crime da polícia e talvez a justiça mais uma vez seja vista como alguma coisa que acontece nas ruas, e os tribunais se tornem lugares complementários onde se lute pela justiça.

Randy Alonso.- Rosemari, na verdade acredito que o caso de Rodney y o caso de Diallo são apenas a ponta do iceberg da brutalidade policial, da discriminação que a polícia pratica na sociedade norte-americana, não só em Nova Iorque, mas também em muitos dos estados da União americana e que também se reflete nos tribunais e nas prisões.

Cá tenho um dado que diz que os afro-americanos sofrem, por cima, mais longas condenas do que os brancos.

"No sistema federal das prisões, as sentenças para os afro-americanos são por volta de 20% mais longas do que as dos brancos, por crimes semelhantes, e mais de 60% das mulheres nas prisões nos Estados Unidos são afro-americanas ou latinas."

No vídeo que a passada quarta-feira passou nosso colega Taladrid no programa Passagem ao Desconhecido", Mumia Abu-Jamal falava de suas impressões sobre as prisões nos Estados Unidos. Gostaria que escutassem este trecho.

Mumia Abu-Jamal.- Toda esta área é como um grande inferno iluminado, e a sua construção custou mais de 200 milhões de dólares.

As celas são, de certa meneira, semelhantes a este quarto. Depois de fechar a porta não há barulho, o silêncio é absoluto, só resta o som do silêncio mesmo dentro de nós.

É difícil, virtualmente impossível, falar com outra pessoa que não seja com o homem que esteja diretamente adjacente, justamente para com os seus botões, porque não há barreiras, não há barulhos que venham do exterior, só existe o barulho do ar condicionado, o son de silêncio, o som que nós próprios criamos. Mas a sensação do isolamento não é total, porque geralmente nós próprios nos podemos ouvir, inclusive desde aqui, o som da presença doutras pessoas.

Randy Alonso.- Bom, Mónica, depois de ouvir estas palavras de Mumia, o que é que nos puderias dizer sobre a situação que existe hoje nas prisões norte-americanas? O que é esta indústria das prisões? Como mulher, o que que sabes da situação das mulheres nas prisões dos Estados Unidos?

Mónica Moorehead.- Gostaria começar a dizer que existe uma guerra racial dentro dos Estados Unidos.

Ouvimos alguns comentários sobre esta guerra, mas esta guerra é contra os pobres e os submetidos nos Estados Unidos, nomeadamente na forma do complexo industrial pentenciário, o qual significa que a construção das prisões e a indústria das prisões junto do trabalho escravo tem-se fusionado para criar o que é conhecido hoje como o setor produtivo de mais rápido crescimento nos Estados Unidos. Antes do mais, quem são as vítimas do complexo industrial pentenciário de que tanto falamos nesta mesa redonda? Isto é, nas prisões nos Estados Unidos existem 2 milhões de pessoas, nos cárceres locais, estaduais e federais, e espera-se que a população aumente para 2,07 milhões no fim deste ano. Quer dizer, 25% dos presos a nível mundial se encontram nos Estados Unidos, por conseguinte é o país que tem maior percentagem a nível mundial.

Há milhares e milhares de prisioneiros nos Estados Unidos que são analfabetos, drogaditos, ou têm problemas mentais.

No relativo às mulheres, elas constituem a população que cresce mais rapidamente dentro das prisões, fundamentalmente pelo problema das drogas, por crimes não violentos relativos às drogas, junto da eliminação dos benefícios de bem-estar social. Muitas das mulheres presas são mães, mães solteiras, muitas deles têm os seus bebés no cárcere, e pensamos que isto é um crime de lesa-humanidade.

Nesses cárceres há polícias que são mulheres e abusam das mulheres presas, as violam, e o fazem com todo tipo de impunidade.

Presentemente um grupo de mulheres nas prisões de Nova Iorque fizeram público este problema, e foi uma coisa muito valente delas, porque são mulheres que depois são alvos de ataques da parte destes guardas das prisões. Então, o nível de abuso é ainda maior. Foram mulheres muito valentes por denunciar estas questões. Agora o povo dos Estados Unidos conhece o que está acontecendo, sobretudo no estado de Nova Iorque.

Nos cárceres existe o que é chamado ciminalização de toda uma geração de jovens. Nos cárceres, nomeadamente as privadas, e este é o principal fator do complexo penitenciário, a juventude está à mira destes encarceramentos.

Já foi mencionado de que a taxa de crimes entre os jovens tem diminuído, segundo as estatísticas, mais de 9,3%; contudo, o nível de encarceramento de jovens tem aumentado em 10%. Isto é, há uma coisa exquisita na correlação de estatísticas.

Quem está por trás deste crescimento do complexo industrial penitenciário Logicamente firmas de Wall Street e os bancos, que são os encarregues do financiamento da construção destas prisões privadas nos Estados Unidos.

No fim deste ano, terão sido empregues 41 bilhões de dólares na construção de prisões privadas neste país, nomeadamente a Shearson-Learson, American Express e outras corporações que compram e vendem ações, e tudo isto funcionam dentro da Wall Street e acontece dentro desta onda de novas indústrias de mão-de-obra barata. As corporações dos Estados Unidos já não têm que fechar as fábricas neste país e ir embora para o México, a Indonésia, Porto Rico ou para outros países submetidos para empregarem este trabalho escravo; o úncico que têm que fazer é, simplesmente, deslocar-se para outro estado, construir a prisão, e fazer com que os prisioneiros trabalhem por 23 centavos e um ou dois dólares a hora para produzir mercadorias que a faziam os trabalhadores dos sindicatos.

Acho que isto constitui uma ameaça real para a organização sindical, porque o impato disto é diminuir os salários dos trabalhadores e destruir o movimento sindical nos Estados Unidos. De tal maneira que pensamos que é muito importante que o movimento sindical aborde o tema do trabalho escravo nas prisões, e que estes trabalhadores nas prisões se organizem em sindicatos. Porque estes são trabalhadores desempregados que se vêem obrigados, pelo se estado de privação econômica, a irem para as prisões em primeiro lugar. Temos companhias de telefone, por exemplo, a IT&T e a Sprint, que tiveram lucros a partir dos prisioneiros nos Estados Unidos, porque nestas prisões telefonam e os que pagam são seus familiares. Os conglomerados de telefone cobram 3 dólares por cada chamada, e isto faz com que os lucros sejam inormes. Eles publicaram guias telefónicas para a promoção deste tipo de trabalho escravo nas indústrias penitenciárias que existem em todas as prisões dos Estados Unidos. O governo federal também tem desempenhado seu papel no relativio ao crescimento destas penitenciarias.

Em 1996 o governo gastou mais dinheiro na construção de prisões do que nas universidades, Isto indica o que o governo tem em mente para os jovens e para a geração futura deste país. A mensagem é que é melhor colocar os jovens nas prisões do que educá-los e dar-lhes um emprego para que o futuro deles seja sadio nos Estados Unidos.

No que se refere às drogas, as mulheres vão cada vez mais às prisões por este problema das drogas. Os homens negros são o principal objeto desta distribuição de drogas nos Estados Unidos.

Human Rights Watch é um grupo progressista que tem realizado muitos estudos sobre os problemas sociais dos Estados Unidos; fez um estudo que foi publicado na semana passada, onde colocava que os homens negros têm treze vezes mais possibilidades de serem sentenciados a condenas maiores do que os brancos, quando se trata de problemas relativos à droga, embora os homens brancos ultrapassam cinco vezes o número de traficantes nos Estados Unidos.

Ilinois tem as condenas mais severas contra negros pela participação no tráfico de drogas, Um homem negro tem cinqüenta e sete vezes mais possibilidades de ser condenado por posse de drogas do que um branco, e por conseguinte, o nível de encarceramento é muito maior; em Ilinois é de 90%.

Para o 2006, espera-se que a população penitenciária federal aumente em 50%. Quer dizer, nestes momentos há 130 000 pessoas nas prisões federais neste país e para o 2006 vão aumentar para 200 000; isto é devido à sentença severa contra o tráfico de drogas e à eliminação da liberdade condicional e à falta de um programa de reabilitação para os casos de drogas.

Os programas de reabilitação foram praticamente eliminados para as prisões dos Estados Unidos e, por conseguinte, as chamadas soluções que oferece o governo devem sair de firmas corporativas de Wall Street, e simplesmente todas estas pessoas irão para as prisões, porque as instituições mentais e as instituições de reabilitação por drogas foram fechadas porque não têm lucros. Desta maneira funciona o capitalismo nos Estados Unidos.

Em resumo, o complexo industrial penitenciário nos Estados Unidos não está oferecendo nenhum tipo de reabilitação a estas pessoas que cometeram crimes, marginais ou outros tipos de crimes porque, simplesmente, está participando nesta repressão que é inerente do sistema capitalista; este sistema capitalista que sabemos que sua base é a obtenção de lucros à custa de não poder oferecer o que muitas pessoas necessitam.

Os presos nos Estado Unidos produzem, no relativo ao valor por conceito de mercadorias produzidas, 1 100 milhões de dólares, e realmente, o principal interesse deste complexo é obter lucros, não importa o que tenham a fazer, sempre que os bolsos fiquem cheios, ainda que seja à custa dos seres humanos.

É uma situação muito pérfida a que está acontecendo nos Estados Unidos. Mumia tem falado muito nisso. Shaka também falou sobre este tema, e pensamos que Mumiam Shaka e muitos outros prisioneiros políticos são verdadeiramente a face racista que se produz no interior das prisões. Mumia constitui a face da luta contra a violência policial nos Estados Unidos. Por isso achamos que o governo dos Estados Unidos, conjuntamente com a classes dominantes e que apoiam o governo, quer o silêncio de Mumia; não sua morte, mas seu silêncio, porque Mumia negou-se a não falar destas injustiças e de destes fatos, inclusive em contra de sua própria situação individual.

Por exemplo, o ano passado houve uma greve na cidade de Nova Iorque dos trabalhadores da ABC que pediam benefícios e Mumia teve a oportunidade de participar num programa muito importante da TV nacional que se chama 20/20 com Sam Donaldson —estes trabalhadores estavam numa greve contra a ABC— e teve a oportunidade de lhes dar sua versão sobre os fatos a muitas pessoas nos Estados Unidos através dos médias e negou-se a enfrentar os grupos. É uma pessoa tão honorável e sempre tem estado junto dos direitos dos trabalhadores e dos pobres, e por isso pensamos que é tão importante para nosso movimento. Temos que intensificar esta luta para poder obter um novo julgamento para Mumia, porque pensamos que deve ser libertado. Na verdade, nunca deveriam ter levado à cadeia.

Para as camadas dos Estados Unidos, cujas mentes estão tão controladas pelos médias capitalistas, pela ABC, a CBS e a NBC, que lhes lavam o cérebro todos os dias para tentar mostrar uma imagem muito negativa das pessoas que se encontram na prisão, de que são marginais e faz falta mantê-las fechadas porque constituem uma ameaça para a sociedade. Com essas idéias inundam às camadas americanas todos os dias. Temos que afirmar: "Este homem merece um novo julgamento", e é a única forma em que poderemos obter sua liberdade, e as pessoas entendem isso. Temos que colocar esta questão a um nível que as pessoas o possam perceber, e de fato o entendem; porque se podemos apresentar todas estas provas novas, a respeito do caso de Mumia, todas estas provas novas que foram explicadas aqui neste painel, isto poderia fazer com que as pessoas afirmassem o seguinte: "Bom, este homem não recebeu um julgamento justo. Não mereceria ele receber um julgamento justo, não é um direito de todos? Foram omitidas muitas das provas e houve muitas irregularidades ao redor de seu caso.

Penso que quando as pessoas conheçam tudo isto, poderão começar a pôr em causa não só o que aconteceu com Mumia, mas o que está acontecendo com o sistema judiciário dentro dos Estados Unidos; porque, em última instância, isso é o que queremos, que as pessoas refletam sobre as injustiças que estão acontecendo todos os dias nos Estados Unidos e sobre muitas coisas que simplesmente desconhecem. Muitas pessoas não conhecem e, por conseguinte, desde 1998 o Supremo Tribunal de Pensilvânia denegou a apelação de Mumia pela segunda vez; o movimento em favor da libertação de Mumia decidiu pôr em prática um programa para lutar para que seja considerado um novo julgamento a Mumia, e este foi um movimento para tentar alargar o apoio ao seu caso, e queremos fazer todo o esforço possível, e o fizemos através de manifestações. Realizamos uma concentração muito importante em Madison Square Garden, a 7 de Maio, onde participaram 6 000 pessoas, para além de todos os discursos proferidos por Mumia em vários atos de formatura.

Isto foi de grande ajuda para alargar o apoio e ajudar para que o nome de Mumia fosse conhecido nos Estados Unidos.

Randy Alonso.- Mónica, muito obrigado, pela explicação e por esses argumentos que nos ofereceu hoje. Você falava uma coisa que nos parece muito importante, que Mumia disse que a voz dele não poderá ser calada, e na verdade, não pode ser calada.

Para este final temos um momento muito emotivo, que vai até o fundo dos nossos corações, e e´que Mumia soube que esta mesa redonda ia ter lugar no dia de hoje, nesta segunda-feira, e desde a sua prisão enviou uma mensagem para esta mesa redonda e uma mensagem para o povo de Cuba.

Mumia Abu-Jamal.- Viva John África!

Viva Cuba livre!

Viva a Revolução!

Viva Fidel!

Meus irmãos e irmãs de Cuba:

Obrigado pelo convite e pela oportunidade de falar com vocês. O meu nome é Mumia, e sou um preso político dos Estados Unidos.

Este país fala de democracia, de justiça e de liberdade, mas é uma prisão de nações. É um país onde mais de 2 milhões de homens, mulheres e jovens estão enjaulados em prisões norte-americanas.É um país onde a policia dispara a homens negros como por exemplo Amadou Diallo, assassinado por 42 disparos, pelo grande crime de ser negro na América branca. Amadou Diallo não o sabia, mas sua condena a morte o esperava!. Assim é a justiça norte-americana.

E o quê é que acontece com os cubanos nos Estados Unidos? Conheci a muitos deles na prisões de Pensilvânia. Há muito tempo que estão nas prisões norte-americanas, sem data de excarceração, porque são marielitos. Não importa o tempo ao que foram condenados, nunca vão sair do cárcere. Assim é para os cubanos sob a justiça norte-americana.

Mais de 3 000 homens, mulheres e jovens esperam a morte nas celas dos condenados dos Estados Unidos da América. A maioria sem advogados. Alguns com advogados, quem dormiram durante o julgamento de seus clientes; outros com polícias que mentiram para inventar confissões. Com negros rotinariamente removidos dos juris. A justiça norte-americana.

Meus irmãos e irmãs de Cuba: obrigado por esta oportunidade. Aqui a luta pela liberdade continua!

Venceremos!

Ona move, viva John África!

Este é Mumiua Abu-Jamal.

Randy Alonso.- Acho que foi um privilégio desta mesa redonda ter escutado esta mensagem de Mumia desde sua prisão, em espanhol, além disso, fazendo um esforço para que nosso povo pudesse escutar sua mensagem, e acho que foi o melhor encerramento para esta mesa redonda que no dia de hoje tem analisado o caso de Mumia Abu-Jamal, outros casos significativos dentro do racismo e da segregação que condena a muitos homens injustamente nos Estados Unidos, e de todo o sistema racial que sustenta todos os casos que hoje estivemos discutindo.

Lembro que hoje, dia 19, comemoram-se 47 anos do assassinato de Ethel e Julius Rosenberg, e gostaria acabar lendo o poema que Ethel lhe deixou a seus filhos pouco antes de ser executada.

Vocês o saberão meus filhos, o saberão

Por que deixamos de cantar a canção.

O livro sem ler, o trabalho sem fazer

Para descançar embaixo da terra...

Meus filhos não fiquem mais aflitos, nunca mais

Pela mentira que nos mata.

Com uma lágrima inocente e uma dor

levando alto a frente bradarão.

A terra irá sorrir meus filhos, sorrirá

e sobre o verde do túmulo, quando triunfemos

o mundo será alegre e os homens se amarão

em fraternidade e paz.

Trabalhem e constroam um monumento à felicidade

Aos valores da humanidade

À fé mantida até o fim.

Para vocês,

Por vocês...

Por nós, por Cuba, pelo povo americano, porque os sinos não tenham que dobrar mais pelo abuso, a discriminação e a injustiça, continuaremos nosso combate.

Muito obrigado.