Mesa-redonda informativa efetuada nos estúdios da Televisão Cubana em 12 de abril de 2002, “Ano dos Heróis Prisioneiros do Império”, sobre os graves acontecimentos ocorridos na Venezuela.

 

(Versões Taquigráficas – Conselho de Estado)

 

Randy Alonso – Muito boa tarde, queridos telespectadores e ouvintes.

Cubavisión, Rádio Rebelde e Rádio Habana Cuba começam  transmitir a mesa-redonda informativa sobre os graves acontecimentos que tiveram lugar na Venezuela e que provocaram a derrubada e a detenção, pelas forças contra-revolucionárias, do presidente constitucional da República Bolivariana da Venezuela, Hugo Chávez Frías.

Para isso, acompanham-me, esta tarde, no painel, o companheiro Rogelio Polanco, diretor do jornal Juventud Rebelde; Juana Carrasco, chefa da Redação Internacional, também do jornal Juventud Rebelde; Lázaro Barredo, jornalista do jornal Trabajadores, e Eduardo Dimas, comentarista internacional do Sistema Informativo da Televisão Cubana.

(Projetam-se breves imagens sobre o tema)

Na madrugada desta sexta-feira, e após uma jornada de graves distúrbios na capital, como informava nossa imprensa nacional no dia de hoje, as forças contra-revolucionárias venezuelanas conseguiram derrubar o presidente Hugo Chávez. A cúpula empresarial de Fedecâmaras e a ilegal direção da Central de Trabalhadores da Venezuela haviam promovido, durante o dia de ontem, graves e provocadores atos de violência, em uma manifestação organizada contra o Palácio do Governo, em um momento em que Chávez se dirigia à nação. Membros da oposição dispararam com armas de fogo contra a Guarda Nacional e partidários do processo bolivariano, exatamente alguns minutos após Chávez denunciar o caráter insurrecional da greve geral indefinida decretada pelas duas entidades, com o apoio dos meios privados de difusão.

Estes acontecimentos, muito bem manipulados pela imprensa e meios de comunicação venezuelanos, foram acompanhados pela imprensa internacional e converteram-se em centro de atenção da opinião pública mundial.

Um golpe contra-revolucionário derrubou o governo do presidente Chávez.

Na tarde de hoje, nosso ministro de Relações Exteriores, o companheiro Felipe Pérez Roque, fez importantes declarações, em nossa Chancelaria, a jornalistas nacionais e internacionais credenciados em nosso país.

Proponho-lhes começar nossa mesa-redonda informativa com as declarações feitas por nosso Chanceler na tarde de hoje.

         Felipe Pérez – Boa tarde.

         Agradecemos a todos terem vindo ao Ministério para receber esta informação.

Convocamos a imprensa nacional e estrangeira credenciada em Havana, para informar que, neste momento, em meio à situação de golpe de Estado que está ocorrendo na Venezuela, uma turba de aproximadamente 400 pessoas está assediando a Embaixada cubana em Caracas. À frente dessa turba violenta, estão agindo membros da extrema-direita cubana, residentes na Venezuela, representantes ali da Fundação Nacional Cubano-Americana e de outros grupos extremistas e terroristas que radicam em Miami, Estados Unidos.

Esses elementos extremistas de origem cubana chegaram primeiro à Embaixada cubana e ali, em meio a um clima de tolerância e de absoluta impunidade, começaram a convocar outros setores extremistas e violentos da população venezuelana, que apoiaram o golpe de Estado, para romper a porta da Embaixada cubana e penetrar no local ocupado pela  Embaixada cubana em Caracas.

Neste momento assediam a Embaixada; foi totalmente cortada a eletricidade e a água do pessoal diplomático cubano que trabalha em nossa sede diplomática; está-se chamando a cortar o fornecimento de alimentos a nossa Embaixada e estão-se fazendo insistentes chamadas, com a participação de alguns canais privados de televisão venezuelanos que estiveram envolvidos nos acontecimentos de ontem e no golpe de Estado contra o governo constitucional venezuelano, para assediar pela força e penetrar no recinto diplomático da Embaixada cubana.

O pessoal diplomático cubano, o embaixador cubano, Germán Sánchez, tentou comunicar-se com a Chancelaria venezuelana, inclusive enviando, por fax, uma nota diplomática explicando estes graves acontecimentos; comunicou-se com o prefeito dessa zona da cidade de Caracas, convocando-os a cumprir suas responsabilidades na proteção do pessoal diplomático cubano credenciado em Caracas e de seus familiares. Não receberam resposta; em meio à situação de caos generalizado, ninguém respondeu na Chancelaria, nem na prefeitura.

O pessoal diplomático cubano que neste momento está em nossa sede tem instruções para não permitir a penetração ilegal em nosso recinto diplomático. E quero deixar claramente informado que, se penetram ali elementos dessa turba violenta, que põe em perigo a integridade física dos diplomatas cubanos e de seus familiares, nossos diplomatas não vão deixar de defender nossa Embaixada, ainda que ao preço de suas próprias vidas.

O Governo de Cuba responsabiliza os golpistas, que, através de um golpe de Estado, estão tentando tomar ilegalmente o poder na Venezuela, pelo que ocorra na Embaixada cubana, pela integridade física, pela preservação das vidas dos diplomatas cubanos e de seus familiares, e pelos bens de nosso imóvel. Eles serão responsáveis, já que, neste momento, violando os convênios internacionais e a Convenção de Viena sobre relações diplomáticas, estão tolerando essa atividade violenta e extremista contra o pessoal diplomático credenciado em Caracas.

Repito que nosso pessoal diplomático tem orientações e total disposição, caso penetrem na sede diplomática cubana, para defendê-la, ainda que ao preço de suas vidas.

Por outro lado, quero expressar que todas as notícias que chegam da Venezuela deixam absolutamente claro que ontem foi dado na Venezuela um golpe de Estado. O Procurador Geral da República acaba de informar à imprensa que o presidente Chávez foi detido e que está retido pela força em uma instalação militar, e que é absolutamente falso que haja renunciado. “O presidente Chávez não renunciou,” – disse o Procurador – “não existe nenhum documento que tenha sido mostrado à opinião pública com a renúncia do presidente Chávez.” Portanto, neste momento, o presidente Chávez é o presidente constitucional da Venezuela, que foi retido pela força, enquanto avança um golpe de Estado na Venezuela.

O Procurador expôs claramente que, de acordo com a Constituição venezuelana, e não apenas a Constituição de 1999, disse, mas também a de 1961, ainda que o Presidente constitucional da República houvesse decidido renunciar, essa renúncia deve efetivar-se diante do plenário da Assembléia Nacional do Parlamento venezuelano, e isso não ocorreu.

O Procurador Geral denunciou que se impede a Procuradoria Geral de ter acesso e contacto com o presidente Chávez, que as notícias que tiveram foram através de fontes castrenses, de alguns procuradores militares que tiveram acesso ao lugar onde se mantém detido ilegalmente e pela força, o Presidente constitucional da Venezuela.

O Procurador Geral disse que, se o Presidente constitucional renuncia – o que não aconteceu, não se apresentou nenhum documento, não se permitiu o acesso do Presidente Chávez à opinião pública, não existe o documento, não ocorreu reunião da Assembléia Nacional, onde, segundo a Constituição, ele deveria renunciar – se assim fosse, então, segundo a Constituição, corresponde ao Vice-Presidente da República, neste caso o senhor Diosdado Cabello, substituí-lo, e o presidente Chávez não destituiu nem o Vice-Presidente, nem os ministros que compõem o Gabinete. Portanto aqueles que tentam usurpar o poder pela força e violentamente na Venezuela estão violando a Constituição venezuelana, os fundamentos do Estado de direito, e estão pondo o país em uma situação de total violação dos preceitos da Carta Democrática Interamericana, aprovada pela Organização dos Estados Americanos.

O Procurador disse que o Presidente está detido injustamente, que não assinou nenhuma renúncia, que ainda que o Presidente e o Vice-presidente da Venezuela houvessem renunciado, segundo a Constituição, cabe ao Presidente da Assembléia Nacional Venezuelana tomar o controle do país. Portanto os acontecimentos que vêm ocorrendo desde a madrugada são uma violação da Constituição venezuelana, e a junta golpista que lá está tentando consolidar-se no poder, viola a Constituição venezuelana e viola os preceitos democráticos estabelecidos na Organização dos Estados Americanos, a que pertence a Venezuela.

Vários governadores venezuelanos denunciaram o golpe, resistiram a aceitar a legitimidade do poder dos golpistas; vários foram presos e conduzidos a lugares desconhecidos, em meio a uma perseguição e a uma repressão de que participaram setores castrenses e elementos golpistas, ligados à junta que ilegalmente, há algumas horas, acaba de proclamar-se no poder na Venezuela.

Cuba denuncia ante a opinião pública internacional esse golpe de Estado.

Cuba responsabiliza os golpistas, que neste momento toleram o assédio a sua Embaixada, por todo que ocorra ali, ao pessoal diplomático cubano e a seus familiares. Cuba reitera que sobre seus ombros cairá a responsabilidade por uma situação de violência e de agressões contra o pessoal diplomático cubano.

Cuba reitera que o pessoal diplomático cubano defenderá nossa Embaixada, se aqueles elementos nela penetram, ainda que ao preço de suas vidas, e responsabiliza aos setores golpistas que permitiram e toleraram que fossem estimulados e convocados setores extremistas a invadir a Embaixada cubana, que neste momento funciona sem água, sem eletricidade e totalmente bloqueada por aqueles elementos, que estão atuando ali com total impunidade.

O Procurador disse que não há, neste momento, um Estado constitucional na Venezuela, está-se dando um golpe de Estado, em que uma junta de fato, violando a lei venezuelana, a Constituição, intenta apropriar-se do país.

Queremos que nosso povo, nossa opinião pública e a opinião pública internacional especialmente saibam desses graves acontecimentos.

Perguntas.

Lucía Newman (CNN) – Sim, boa tarde, senhor Chanceler.

Duas perguntinhas: Primeiro: há algo de certo nos rumores ou informes de que a esposa do presidente Chávez está em Cuba? E, segundo: qual é sua reação diante do anúncio feito por Petróleos da Venezuela de que, a partir de agora, nem uma gota mais de petróleo venezuelano será fornecido a Cuba?

Felipe Pérez – A esposa do presidente Chávez não está em Cuba.

Petróleos da Venezuela está sendo dirigida, neste momento, por um grupo de pessoas que respondem aos golpistas que neste momento tentam consolidar-se no poder na Venezuela, por meios ilegais, em meio a um golpe de Estado, e a tomada de fato do controle do país. Cuba não reconhece legitimidade à direção de PDVSA, que responde aos setores golpistas.

Mauricio Vincent (El País) – Ministro, duas perguntas também.

Na noite de ontem, o Presidente cubano pôde falar com o Presidente venezuelano, antes que ficasse incomunicável?

E a segunda pergunta é se Cuba vai tomar alguma iniciativa, em algum foro internacional, na ONU, não sei, de denúncia dessa situação, em curto prazo.

Felipe Pérez – Sim, o presidente Fidel Castro comunicou-se na madrugada de ontem com o presidente Chávez.

Cuba vai pedir que se convoquem os mecanismos internacionais de preservação da institucionalidade democrática e de respeito ao Estado de direito.

Cuba vai solicitar uma reunião do Gabinete de Coordenação do Movimento de Países Não-Alinhados. Cuba, neste momento, faz gestões com outros países Não-Alinhados, para que essa reunião se realize na Organização das Nações Unidas.

Cuba, neste momento, comunica à Secretaria Geral das Nações Unidas a situação de assédio e violência contra sua sede diplomática em Caracas.

Cuba faz gestões para que o Grupo dos 77, do qual Venezuela neste momento é presidente, tome conhecimento dos graves acontecimentos que levaram a que uma junta golpista tome o poder na Venezuela e nele tente consolidar-se.

Mauricio Vincent – Poderia dizer-nos um pouco do que conversaram e que transmitiu Hugo Chávez ao Presidente cubano?

Felipe Pérez – Não, essa é outra pergunta, apenas posso confirmar que conversaram.

Benito J. Milanés (Radio Rebelde) – Uma pergunta e uma precisão.

A pergunta é sobre a situação dos colaboradores cubanos na República Bolivariana da Venezuela, se é conhecida. E a precisão, qual é a orientação que tem o pessoal diplomático cubano em Caracas para defender a Embaixada, como?

Felipe Pérez – Na Venezuela, neste momento, há 1.043 colaboradores civis cubanos: treinadores esportivos, médicos, pessoal paramédico e trabalhadores e técnicos de outros setores da economia e dos serviços trabalharam ali, em virtude de um acordo legalmente estabelecido entre o governo legítimo da República Bolivariana da Venezuela e o governo cubano.

As notícias que temos, até cinco minutos atrás, são de que esse pessoal está seguro, está em permanente comunicação com seus chefes, com o pessoal que dirige ali a colaboração cubana e com a Embaixada cubana em Caracas. Nós também mantemos contacto permanente, aqui de Havana. Estão localizados em lugares seguros, foram agrupando-se, e neste momento não acreditamos que esse pessoal, a maioria do qual não está em Caracas, mas no interior do país, corra algum perigo.

Em todo caso, responsabilizamos também às autoridades golpistas por qualquer incidente, agressão ou provocação contra esses colaboradores, que lá estiveram prestando valiosos serviços ao povo venezuelano neste período.

O pessoal da Embaixada cubana defenderá a integridade de nossa sede diplomática com todos os recursos a seu alcance, especialmente com suas vidas, que é seu recurso mais valioso.

Andrea (El Universal) – Boa tarde.

Caso se mantenha a atual situação, que avaliação o senhor faria acerca do fato de que Cuba fique sem o petróleo venezuelano, e como isso impactaria, tanto a economia cubana, como o bem-estar da população cubana?

Felipe Pérez – Neste momento, estamos atendendo a uma situação imediata, e esse é um tema sobre o qual pode-se voltar a falar mais adiante. O que posso reiterar aqui é a mais absoluta confiança de que o Governo Revolucionário cubano e o povo cubano estão preparados para enfrentar qualquer situação, até as mais difíceis. Não se deve esquecer que atravessamos 10 anos de período especial, de ruptura brutal e inesperada de nossos vínculos econômicos com os sócios tradicionais, e que o país teve a capacidade, o talento e o apoio do povo para superar tão graves dificuldades.

Quero dizer aqui que Cuba agora espera em expectativa, e acompanha com extrema atenção a reação do Grupo do Rio, que se reúne em São José da Costa Rica, a reação da Organização dos Estados Americanos e a reação dos governos do continente, inclusive do governo dos Estados Unidos, sobre essa violenta ruptura da institucionalidade democrática em um país do hemisfério. Cuba acompanha com extrema atenção as reações que terão neste caso, e espera que os governos da região e as instituições regionais e internacionais oponham-se ao golpe de Estado dado na Venezuela, e exijam, como Cuba, a restauração do governo democrática e constitucionalmente eleito na Venezuela, o retorno das autoridades legítimas venezuelanas, e espera que não haja nenhum tipo de tolerância ou conivência, especialmente nestes tempos de tanto discurso a favor da democracia e da institucionalidade democrática e do respeito aos direitos humanos, quando se sabe que, na Venezuela, um grupo de golpistas tomou, ilegitimamente e pela força, o controle do país.

Jornalista – Ministro, por favor, há funcionários asilados na Embaixada cubana? Estaria, entre eles, o Vice-Presidente Cabello?

Felipe Pérez – Não há absolutamente nenhum venezuelano asilado na Embaixada cubana em Caracas, são falsas as acusações que nesse sentido fizeram ali os líderes da extrema-direita cubana terrorista, ligada aos setores extremistas de Miami, para estimular setores violentos da população venezuelana a invadir, assediar e tomar de assalto a Embaixada cubana, que sofre, neste momento, um bloqueio de comunicações, de eletricidade, de água e de acesso ao exterior.

Os veículos diplomáticos do pessoal cubano, que estavam estacionados no exterior de nossa sede diplomática, foram golpeados, alguns praticamente destruídos. Sem dúvida, o pessoal diplomático cubano e seus familiares, com toda a serenidade, preservam, neste momento, a vida e a segurança dos familiares, do pessoal. E esperamos que não se produza uma situação violenta – que seria muito grave – contra os diplomatas cubanos e seus familiares, que gozam de imunidade diplomática, segundo todas as convenções internacionais sobre a matéria.

Algo mais?

Oscar Madrid (ANSA) – Senhor Chanceler, imaginando outros cenários, se o golpe de Estado na Venezuela se consolida, qual seria a atitude do governo cubano? E, nesse caso, caberia a possibilidade de dar asilo ao presidente Chávez?

Felipe Pérez – Não posso imaginar um cenário de consolidação de um golpe de Estado na América Latina, no século XXI. Não posso crer que isso seja possível. Espero que a pressão internacional dos governos da região, do governo dos Estados Unidos e dos demais governos da América Latina, espero que a pressão do Grupo do Rio, da Organização dos Estados Americanos, exigindo o cumprimento da cláusula democrática da Carta Democrática Interamericana, impeçam que se consolidem no poder os golpistas que hoje estão usurpando ilegalmente o poder na Venezuela. De maneira que não concebo esse cenário, seria uma gravíssima violação e um precedente muito negativo, e um golpe demolidor à credibilidade de todo o discurso a favor da democracia que durante anos se tem feito neste hemisfério.

Espero que esta vez não se permita, como já se tolerou uma vez, uma ditadura golpista em um país da América Latina. E não posso imaginar o cenário de que os governos da região, de que as instituições democráticas regionais tolerem, apóiem ou reconheçam a um governo que, segundo o Procurador Geral da Venezuela, está constituindo-se ali ilegalmente, com o Presidente constitucional detido, sem que tenha renunciado, sem que tenha renunciado o Vice-Presidente, sem que tenham renunciado ou tenham sido destituídos os ministros, absolutamente pela força, um golpe de Estado. Não posso imaginar esse cenário.

Sobre o presidente Chávez, primeiro é preciso saber o que farão com ele os golpistas, que neste momento o mantêm detido e incomunicável, sendo o Presidente constitucional do país, sem que haja renunciado, sem que tenha sido mostrado nenhum documento, e quando se está falando, com toda falácia, de uma “transição democrática” na Venezuela.

Cuba rejeita que se chame a esse gole de Estado “uma transição democrática”. Ocorreu um golpe de Estado na Venezuela, e consideramos que deve ser rechaçado, condenado e que se deve exigir dos golpistas que detêm o poder, que o entreguem novamente às autoridades constitucionais venezuelanas, democraticamente eleitas pelo povo, em virtude da Constituição venezuelana.

Mery Murray (NBC) – Ministro, o senhor pode dar algum dado sobre os diplomatas cubanos em Caracas, quanta gente está na Embaixada? Quantas esposas há no país, quantas crianças, onde estão as esposas e as crianças?

E ainda, o Ministério recebeu hoje alguma petição de asilo dos venezuelanos que neste momento estão aqui em Cuba?

Felipe Pérez – O Ministério ainda não recebeu nenhum pedido de asilo, não temos conhecimento de que isso tenha acontecido.

O pessoal diplomático e seus familiares ali são várias dezenas de pessoas, as mulheres e as crianças estão, neste momento, preservados na Residência do Embaixador cubano, e a Embaixada, neste momento, é defendida por um grupo de funcionários diplomáticos de nosso país. Há ali também outros familiares, e esperamos que suas vidas sejam preservadas e que a imunidade dos recintos diplomáticos cubanos ali seja respeitada.

Algo mais?

Moderador – Última pergunta, Ramírez.

Francisco Ramírez (Notimex) – Ministro, em meio a uma situação tão fluida e inconsistente, Cuba tem preocupações fundadas acerca da integridade física do presidente Chávez?

Felipe Pérez – Cuba tem preocupação acerca da integridade física do presidente Chávez, que neste momento está incomunicável, detido e retido pela força, em uma instituição militar, em um quartel do exército.

Cuba considera, neste momento, o presidente Chávez Presidente constitucional da Venezuela, e Cuba rechaça a notícia de que o presidente Chávez tenha renunciado, e Cuba desafia os golpistas a apresentar o documento mediante o qual o presidente Chávez renunciou.

José L. Ponce (Diretor CPI) – Muitíssimo obrigado, Ministro.

Felipe Pérez – Muito bem, muito obrigado.

Randy Alonso – Estas foram as declarações de nosso chanceler Felipe Pérez Roque, na tarde de hoje, ante os graves acontecimentos ocorridos no dia de ontem, na República Bolivariana da Venezuela, onde as forças contra-revolucionárias do empresariado de direita venezuelano, uma ilegal Central de Trabalhadores daquele país e os meios de comunicação aliaram-se, em um intento, que finalmente frutificou, de derrubar o presidente Hugo Chávez, o governo da República Bolivariana da Venezuela, e que levou também à participação muito direta do generalato das forças armadas daquele país.

Há vários momentos desses sucessos, que culminaram ontem com a derrubada do presidente Hugo Chávez.

Eu lhes proponho ir delimitando alguns dos aspectos fundamentais das principais forças que participaram nesses graves fatos ocorridos na Venezuela.

Alguns desses antecedentes, que levaram a esses sucessos do dia de ontem, serão comentados por Eduardo Dimas.

Eduardo Dimas – Obrigado, Randy.

Sim, efetivamente, em 6 de abril passado, a direção ilegal da Confederação de Trabalhadores da Venezuela, junto com a cúpula empresarial, ou seja, com setores da burguesia e da oligarquia venezuelanas, que se agrupam em Fedecâmaras, anunciam uma greve de 24 horas, em apoio aos gerentes da Petróleos da Venezuela S.A., ou seja, gerentes que haviam sido aposentados, gerentes que haviam sido afastados, como resultado de sua oposição à nova direção que havia naquele momento, que havia sido designada pelo governo. Recordemos que a Petróleos da Venezuela é uma empresa estatal.

Ou seja, já nesta união, na união da direção ilegal da Confederação de Trabalhadores da Venezuela e da Fedecâmaras temos um elemento importante: a aristocracia trabalhadora se une à burguesia, para fazer uma greve. Em 9 de abril, ocorre precisamente essa greve, que afeta, em maior ou menor medida, a diferentes setores do país; sem dúvida, meios de imprensa assinalavam que nenhum dos setores econômicos do país foi afetado em mais de 40%, e a cúpula sindical e a cúpula empresarial decidem uma prorrogação da greve por mais 48 horas.

Em 10 de abril, a Confederação do Trabalho e a cúpula empresarial anunciam que a greve geral passa a ser por tempo indefinido, e essa é a origem, em geral, dos sucessos, das manifestações que ocorrem posteriormente e que dão pé a toda essa situação que termina com a derrubada, por meio de um golpe de Estado, do presidente Hugo Chávez.

Agora, eu creio que o primeiro que se deve ter em conta – este é, na verdade, o desenlace – é que os antecedentes do processo contra a Revolução Bolivariana e o presidente Chávez remontam ao exato momento em que Hugo Chávez assume a presidência, após as primeiras eleições, e realiza uma série de reformas, uma mudança na Constituição e novas eleições, nas quais é eleito Presidente. E tira do poder, desbanca os partidos venezuelanos tradicionais, como Ação Democrática e COPEI, que se revezaram no poder durante 40 anos e, definitivamente, a única coisa que fizeram foi afundar na miséria 80% da população venezuelana, uma das nações mais ricas da América Latina.

Recordemos também que o processo que conduz a essa situação, ou seja, esse processo de desestabilização desenvolvido por esses setores contém vários aspectos, aspectos que inclusive foram utilizados em outros lugares – recordo o Chile de Allende, entre outros –, um deles é a descapitalização do país: entre 1999 e 2001, mais de 23 bilhões de dólares foram tirados da Venezuela, precisamente por esses setores da burguesia nacional e investidores estrangeiros; uma sistemática campanha de imprensa, que era diária, através de todos os canais de televisão, das emissoras de rádio, dos jornais; a busca de conflitos trabalhistas e sociais, manifestações provocadoras, mentiras, boatos, enfim, todos os mecanismos utilizados pela reação, desde que o mundo é mundo. E é depois disso que se cria essa situação, que conduz mais tarde aos sucessos que ocorrem a partir de 9 de abril. Tudo isso teve um momento importante em 1º de dezembro do ano passado, quando foi convocada uma greve de 12 horas, por parte da cúpula empresarial.

Portanto o que estamos vendo agora é o desenlace de toda uma campanha, desenvolvida pela burguesia e pela oligarquia nacional venezuelana, com a ajuda dos partidos que haviam sido desbancados do poder, e com a ajuda de setores da aristocracia operária e de sindicatos vendidos, sindicatos ilegais, que conduz à situação que se apresentou no dia de ontem.

Randy Alonso – Creio que são importantes os antecedentes explicados por Dimas, para poder entender todos esses acontecimentos que, desde terça-feira, ocorreram na Venezuela: uma greve geral malograda em seu primeiro dia, prolongada por 24 horas e chamada depois a ser por tempo indefinido, por essa conjunção de forças contra-revolucionárias integrada pela cúpula empresarial, por sindicatos ilegais e pelos meios de comunicação, que representaram um papel importantíssimo nesse golpe de Estado dado ontem na Venezuela, e que foi apoiado finalmente pelo exército, pelas Forças Armadas da Venezuela.

Foi uma provocação bem orquestrada, que teve várias manifestações de greves convocadas por essa mesma comunhão de forças contra-revolucionárias, desde dezembro; em dezembro, janeiro, fevereiro, ocorreram diversas manifestações, convocadas por essas mesmas cúpulas, para enfrentar o processo bolivariano, e que teve sua expressão mais acabada, poderíamos dizer assim, nesses três dias, especialmente no dia de ontem, quando se converteu em uma provocação bem fabricada, que conduziu a um golpe de Estado.

Sobre a provocação e a denúncia que o presidente Chávez fez na tarde ontem, em uma transmissão em cadeia para todo o país, fala-nos o companheiro Rogelio Polanco.

Rogelio Polanco – Na tarde de ontem, às 15h 45min, o presidente Chávez convoca as redes de televisão, para transmitir em cadeia seu discurso à nação, para explicar a situação em que se encontrava o país. Naquele momento, o presidente Chávez denuncia de maneira muito clara e enfática a conspiração aberta e descarada que estava ocorrendo, para instigar setores da população à violência e, ademais, para alcançar seus objetivos de criar uma situação de instabilidade no país. Naquele mesmo momento, o presidente Chávez denuncia a participação dos meios de difusão no que chamou uma insurreição midiática, pois estavam conclamando a um avanço dos manifestantes para o Palácio do Governo, o Palácio de Miraflores, a partir dos grevistas que haviam sido convocados, como dissemos, por essa cúpula empresarial e pela ilegal Central de Trabalhadores, para chegar até o próprio Palácio do Governo.

O próprio Chávez diz nesse momento que aquelas televisões estavam difundindo rumores, mentiras, inclusive a mentira de que ele estava detido. Na própria intervenção de Chávez, à tarde, tem que dizer a hora em que se estava fazendo a transmissão, dizer que era ao vivo, porque, entre os rumores, dizia-se que aquela era uma intervenção gravada e que não estava ocorrendo naquele momento.

Algumas das televisões, nessa cadeia de televisão, deixam de transmitir as imagens de Chávez e começam a dividir a tela e a transmitir distúrbios, as graves provocações que estavam ocorrendo em frente ou próximo ao Palácio de Governo.

É também nesse momento que o próprio Chávez anuncia a suspensão por tempo indefinido desses três canais de televisão que haviam instigado aquela violência: Rádio Caracas Televisão, Venevisión e RTM, que tinham instigado aquela violência.

A realidade é que essas forças que haviam sido chamadas a ir ao Palácio iam acompanhadas por alguns policiais vestidos de civis, pertencentes à Polícia Metropolitana, que se subordina à Prefeitura Maior de Caracas, dirigida por Alfredo Peña, um acérrimo opositor de Chávez.

Randy Alonso – Que traiu a Revolução Bolivariana.

Rogelio Polanco – Traiu a Revolução Bolivariana, um dos contra-revolucionários que esteve ativamente contrário ao processo bolivariano. Muitos meios colocaram – não os meios de televisão venezuelanos, mas outros – dirigentes do governo de Chávez disseram a fontes alternativas – inclusive tenho aqui algumas fontes em La Jornada – que disseram que “naquele momento estavam colocados a apenas 200 metros do Palácio Presidencial alguns franco-atiradores pertencentes a essa Polícia Metropolitana, que haviam começado a disparar sobre uma manifestação de apoio a Chávez”. Estou lendo esse artigo que saiu hoje no diário La Jornada, que diz, ademais, que “Juan Vicente Gómez, da rede bolivariana, declarou a La Jornada que os policiais da Prefeitura Maior de Caracas, a cargo do opositor Alfredo Peña, atuaram contra os simpatizantes de Chávez, que os franco-atiradores pertenciam aos grupos da conspiração”.

“Desde Miraflores, fontes do governo disseram que um grupo de policiais vestidos de civis, apresentaram-se para entregar suas armas e denunciaram que foram forçados a disparar contra civis.”

Fala-se também de grupos ultra-esquerdistas que estavam convocados pela cúpula empresarial, e que alguns provocaram aos guardas nacionais que estavam cuidando das imediações do Palácio do Governo.

Ou seja, produz-se, a partir daí, um intercâmbio de disparos que provoca a morte de mais de 10 pessoas; algumas fontes falam já de 15 pessoas. fala-se de mais de 100 feridos, algumas fontes também colocam que chegam a quase 300 feridos. Eram as mortes lamentáveis, mas que os manipuladores e os golpistas necessitavam, como pretexto para consumar seu golpe; eram as mortes, ademais, que requeriam, para manipular a situação em que se encontravam e depois provocar os acontecimentos que sobrevieram.

Creio que foi muito clara a denúncia de Chávez à tarde, mas lamentavelmente houve uma conspiração total, para impedir que se soubesse a verdade do que estava acontecendo naquele momento no país.

Randy Alonso – Precisamente, Polanco, o jornal mexicano La Jornada de hoje, em um de seus importantes artigos, da jornalista Estela Calloni, bem conhecida em nosso continente, fala de um golpe ao estilo Pinochet e diz que “uma fonte do Movimento Quinta República, consultada por La Jornada, esclareceu que o que ocorreu foi que houve uma troca de disparos, efetuados por alguns setores da Polícia Metropolitana – a do prefeito Alfredo Peña – contra a guarda presidencial, que o Presidente havia ordenado manter-se na zona, para proteger a seus partidários e impedir um enfrentamento.

“Referiu que, dos 10 mortos, seis eram partidários de Chávez, e a grande maioria dos feridos são também manifestantes favoráveis ao governo.

“Essa mesma fonte disse que foi uma intentona promovida pelos Estados Unidos, pela gente de Carlos Andrés Pérez e sua velha estrutura militar, responsável pelo Caracazo, o prefeito caraquenho Alfredo Peña, do qual depende a Polícia Metropolitana, assim como por outros setores que realizaram visitas ao território estadunidense, como Alberto Franquechi, responsável pelo assassinato de Alberto Lobera e outras vítimas, nos sessenta.”

A seguir, diz La jornada que “de acordo com a fonte de Quinta República, tentou-se dar um golpe militar similar ao chileno de Pinochet, que derrubou Salvador Allende em 1973, como se vê com a paralisação de alguns setores econômicos e a mobilização de setores públicos na rua e com grande difusão através dos meios de imprensa.”

Os próprios acontecimentos levaram a que às 3h 15min da madrugada desta sexta-feira, segundo comentam as agências de notícias, o inspetor geral das Forças Armadas, general Lucas Rincón Romero, desse declarações em que anunciava que “os membros do alto comando militar deploram os lamentáveis acontecimentos ocorridos quinta-feira na capital, e diante de tais fatos solicitou-se a renúncia ao Presidente da República, que a aceitou”, disse naquele momento o general Lucas Rincón Romero, em coletiva de imprensa.

O próprio Rincón havia dito à tarde, aos meios de comunicação, que as Forças Armadas Venezuelanas respaldavam a ordem constitucional, que estavam contra a violência contra a ordem constitucional e que as forças armadas apoiavam o governo constitucionalmente eleito; sem dúvida, às 3h 15min da manhã, é o próprio general Lucas Rincón Romero quem faz essas declarações e diz que “a partir deste momento nossos cargos estão à disposição, agregou Rincón, inspetor geral das Forças Armadas, no forte Tiuna, principal fortaleza militar de Caracas”.

Este general das Forças Armadas Venezuelanas estava dando por certo que o presidente Chávez havia aceitado sua renúncia.

Outros meios de comunicação divulgavam e diziam que “o presidente venezuelano Hugo Chávez ficou detido no forte Tiuna, principal fortaleza militar de Caracas, onde entrou às 4h 07min, hora local, segundo informou o comandante geral do exército, Efraín Vasquez.

“O general disse aos jornalistas que ‘Chávez permanecerá no forte Tiuna, no sul da capital, sob proteção militar, até que se encontre um lugar de reclusão mais apropriado’. Depois informou que ‘pode ser que Chávez seja transferido nos próximos dias à prisão militar de Ramo Verde, na cidade de Los Teques, 25 quilômetros ao sul de Caracas’.”

Segundo um cabo da AFP, o ex-governante venezuelano saiu às 3h 50mim, hora local, ou seja, às 3h 50min da madrugada, do Palácio de Miraflores, sede do governo, escoltado pelo exército venezuelano, rumo ao forte Tiuna, onde chegou 17 minutos mais tarde. “Ia muito sério, com a vista fixa à frente”, vestido com seu fardamento militar, segundo a televisão Globovisión.

As últimas informações indicam que o presidente Chávez se encontra no forte militar de Tiuna, embora permaneça incomunicável e não haja possibilidade de receber confirmação das condições em que se encontra o Presidente constitucional venezuelano, derrubado pelas forças armadas e por esse golpe contra-revolucionário contra seu governo constitucional.

Nós, aproximadamente às 11h da manhã do dia de hoje, ante as notícias que vinham dando os meios de comunicação venezuelanos e ante a tergiversação que se fazia dos fatos ocorridos naquele país, estabelecemos comunicação telefônica com María Gabriela Chávez, filha do presidente Hugo Chávez, e ela fez uma denúncia pública naquela comunicação que quero reiterar em nossa mesa-redonda informativa desta tarde.

Randy Alonso – Estamos em comunicação com María Gabriela Chávez, filha do presidente constitucional da República Bolivariana, Hugo Chávez Frías, derrubado pelas forças contra-revolucionárias nas últimas horas naquele país. O povo cubano vem acompanhando essa informação, consternado pelas notícias que chegam da Venezuela; acompanhamos os meios de comunicação venezuelanos que foram partícipes diretos desse complô contra a ordem constitucional venezuelana e contra o presidente Hugo Chávez e a Revolução Bolivariana; os meios de comunicação venezuelanos estão difundindo a notícia da renúncia do presidente Chávez.

Temos a oportunidade de conversar com María Gabriela Chávez, filha do presidente Chávez. Cumprimentando-a por todo nosso povo, María Gabriela, eu gostaria que você nos contasse qual é a verdade dos graves acontecimentos que ocorreram nas últimas horas em seu país.

María Gabriela Chávez – Primeiro, uma saudação a todo o povo cubano.

Há duas horas conseguimos comunicar-nos com meu pai, que nos chamou por telefone e nos disse que, por favor, comunicássemos ao mundo inteiro que ele nunca renunciou, que ele nunca assinou um decreto presidencial destituindo o vice-presidente Diosdado Cabello, e muito menos renunciou ele; simplesmente, alguns militares foram, detiveram-no e levaram-no ao forte Tiuna, à Comandância Geral do Exército, e neste momento está detido no regimento da polícia militar no forte Tiuna; têm-no completamente incomunicável, somente lhe permitiram falar conosco, seus filhos. Pediu-nos que buscássemos advogados, que falássemos com os amigos, os familiares, para exigir o respeito aos seus direitos e para que possamos vê-lo porque, de fato, não sabia quando poderíamos voltar a falar.

Randy Alonso – Isso foi há aproximadamente duas horas, María Gabriela?

María Gabriela Chávez – Duas horas, às 9 horas da manhã.

Randy Alonso – E depois dessa comunicação, não puderam ter mais notícias?

María Gabriela Chávez – Não. Eu lhe perguntei: “Pai, quando podemos falar com você?” Disse-me: “Não, meu amor, agora vocês têm de ajudar-me, têm de buscar advogados, têm de pressionar e comunicar a todos que estou preso, que sou um Presidente preso” – disse-me textualmente – “e que em nenhum momento renunciou.”

Eu, depois de falar com meu pai, comuniquei-me com o vice-presidente Diosdado Cabello, com todos os deputados da Quinta República, falei também com Juan Barreto, um deputado da Quinta República; está escondido, porque também o buscam; Freddy Bernal o ex-diretor da DISP está seqüestrado; o Procurador Geral da República também está detido, isso não foi dito em nenhum meio de comunicação.

O primordial é que, em realidade, ele nunca renunciou; simplesmente houve um golpe de Estado, que querem encobrir com uma suposta renúncia.

Randy Alonso – Para nós, María Gabriela, todas essas notícias que você nos dá são muito importantes, porque, realmente, estamos acompanhando os meios de comunicação, e não há nenhuma informação sobre o paradeiro real das autoridades venezuelanas, e tem sido muito propagada essa informação da renúncia do presidente Chávez.

Creio que será uma informação muito importante para nosso povo, se você quiser acrescentar outros elementos sobre essa situação.

María Gabriela Chávez – Ele me pediu também que o comunicasse a vocês e ao mundo. Diosdado Cabello disse-me que lhes pedisse que, por favor, denunciem-no ante a OEA, ante o G-77, ante todos os organismos internacionais. É uma ditadura de extrema-direita o que se está instaurando aqui no país, e querem acobertá-lo com uma suposta renúncia. Tudo é mentira, estão buscando todos os simpatizantes do governo para detê-los, e todos estão escondidos.

Randy Alonso – María Gabriela, em meio a essa difícil situação, gostaria de saber também como está a família, como estão seus irmãos e sua filhinha.

María Gabriela Chávez – Nós todos estamos praticamente escondidos; agora estamos bem, já estamos mais tranqüilos, já nos acalmamos, estamos juntos. Aqui comigo está meu irmão Hugo, minha irmã Rosa, minha filha também está comigo; já estamos tranqüilos e temos fé em que tudo vai solucionar-se, e temos de ajudar a meu pai em tudo isso.

Randy Alonso – Gostaria de transmitir, em nome de nosso povo, o carinho, a admiração de nosso povo por vocês, por sua família, expressar-lhes nosso pesar pelos acontecimentos; mas que saibam também que têm aqui muitos irmãos no povo cubano, que estamos com vocês nessas horas difíceis que vive seu país, e que podem contar conosco, com nosso povo, para o que seja necessário, que a televisão e a rádio cubanas também estão abertas para a denúncia, para acompanhar os acontecimentos, e que trataremos de estar em contacto com vocês sempre que seja possível, para acompanhar os graves acontecimentos de seu país.

María Gabriela Chávez – Este é meu celular, vou tê-lo sempre comigo, podem chamar-me a qualquer hora, qualquer coisa; é mais fácil que você se comunique comigo, porque eu não tenho como chamá-los, qualquer coisa que queiram saber, eu vou mantê-los informados. Não temos nenhum problema. Por meu pai, qualquer coisa. Nós também os queremos muito, a todo o povo cubano. Obrigada por esse apoio.

Randy Alonso – Saibam que têm aqui muitos irmãos e que estaremos com vocês também nessa batalha pela verdade.

María Gabriela Chávez – Muito obrigada, nós sabemos.

Randy Alonso – Em informações que estão chegando das agências de notícias, diz-se que foi instaurado de fato o novo governo venezuelano, encabeçado pelo Presidente da Fedecâmaras, e que, além disso, o governo transitório da Venezuela, segundo cabo da AFP, decretou a reorganização dos poderes públicos, e para concretizá-lo decretou também a destituição do Presidente e de todos os magistrados do Supremo Tribunal de Justiça.

Em todo esse enredo do que aconteceu nas últimas horas, e especialmente no dia de ontem e no dia de hoje, um papel fundamental foi desempenhado, precisamente, pela organização dirigida pelo chamado atual presidente de fato da Venezuela, o senhor Carmona.

Creio que o papel da cúpula empresarial reacionária venezuelana merece também a análise desta mesa-redonda. Lázaro Barredo pode falar sobre esse tema.

Lázaro Barredo – Sim, Randy, você sabe que hoje, na posse de Carmona, estavam todos os dirigentes da Fedecâmaras. Fedecâmaras é a federação dos empresários mais vinculados às empresas multinacionais na Venezuela; ou seja, são a gente que mais interesses tem e são os que tiveram a ver com toda a crise institucional que teve de atravessar o governo do presidente Hugo Chávez.

Hoje todos esses empresários gritavam “democracia”, enquanto se comunicava o decreto em que se cassava os deputados do Parlamento, eleitos em eleições democráticas; abolia-se o caráter bolivariano da revolução, acordado em um referendo popular, e destituíam-se os magistrados, o Presidente, o Vice-Presidente da República, o Procurador, ou seja, todas as figuras democraticamente eleitas, no processo possivelmente mais democrático que se teve em toda a América latina nos últimos 50 anos, porque foram autoridades duplamente eleitas, na votação popular mais alta registrada, pelo menos nos últimos 50 anos. O presidente Chávez submeteu-se duas vezes ao processo eleitoral e submeteu a Constituição da República Bolivariana a um processo de referendo popular. E os grandes democratas, que tinham nessa Constituição todos os mecanismos para enfrentar um presidente, comprovaram o revanchismo da contra-revolução, sua sede de vingança, que agora realmente começa, e puseram em prática a violência para acabar com a Revolução Bolivariana.

Fedecâmaras, o setor empresarial, realmente, opôs-se permanentemente aos principais acordos da Revolução Bolivariana, mas foi no ano passado, depois de 13 de novembro, quando a Assembléia Nacional, o Parlamento, através de uma lei habilitadora, outorgou ao presidente Chávez as faculdades para elaborar executivamente um conjunto de leis, 49 projetos de lei, que resolviam a Lei da Reforma Agrária, os problemas da pesca, atendiam ao problema dos hidrocarbonetos, estabeleciam impostos a multinacionais petrolíferas na Venezuela, enfim, a tenuavam a situação democrática e social daquele país, um país imensamente rico, que a Revolução Bolivariana herdou com mais de 85% da população abaixo do nível de pobreza, essas leis buscavam, exatamente, pôr em prática uma política de justiça social, e foi isso que motivou os dirigentes dessa federação de empresários, muito ricos na Venezuela, encabeçados por esse senhor Pedro Carmona Estanga – que é um executivo de uma empresa de produtos químicos, foi diplomata, um homem que gosta de ir muito esquiar nos Alpes e desfrutar muito a doce vida, como grande empresário, alheio realmente aos interesses populares –, empresários que nunca se pronunciaram em relação ao Caracazo, como também os militares, nem nenhuma força política venezuelana, por ocasião do Caracazo, em que houve mais de mil mortos; mas essas pessoas decidiram enfrentar o presidente Hugo Chávez, e convocaram para 10 de dezembro, pela primeira vez na história da Venezuela, uma greve empresarial.

Nunca antes, nem mesmo na ditadura de marcos Pérez Jiménez, de Juan Vicente Gómez, nem em princípios do século XX, quando os grandes banqueiros foram detidos pelo governo do general Cipriano Castro, porque se recusavam a emprestar dinheiro ao Estado, nunca o setor empresarial venezuelano participou de uma greve; sem dúvida, foi agora, no quadro de oposição a essas leis revolucionárias, que enfrentaram as decisões e conclamaram à violência, aos mecanismos desestabilizadores do país, é claro, com apoio estrangeiro, como já se denunciou, com o consentimento de determinadas autoridades, como o governo dos Estados Unidos. Depois, quando se fale aqui dos militares, poderá ser vista a participação da CIA e de outros elementos que instigaram o levante contra o presidente Hugo Chávez.

Toda essa gente confabulou, a isso se somou o fenômeno da decisão do presidente de pôr em ordem a PDVSA, que é a empresa petroleira estatal da Venezuela, de onde saem os recursos financeiros mais importantes do país, e então a gente da PDVSA, a cúpula que havia sido removida por ordem do presidente Chávez, uniu-se com determinada aristocracia operária, aliada à contra-revolução, aliaram-se com a Fedecãmaras e com outros setores e constituíram, então, todo o sistema de greves que trataram de desestabilizar a Venezuela nestes dias e que ontem trouxeram consigo a manifestação que, como vimos e dizia Polanco, para terminar, o presidente Chávez alertou, pela televisão, que essa manifestação podia criar um problema social, um problema de choque com as forças bolivarianas que há dias já estavam frente ao Palácio de Miraflores, e, sem dúvida, apesar de tudo isso, esse mesmo senhor Pedro Carmona instigou a marcha para Miraflores e instigou a violência, que foi o que trouxe consigo os acontecimentos do dia de ontem.

Randy Alonso – Carmona, que hoje se auto-proclamou presidente de fato da Venezuela.

Lázaro Barredo – Com Peña e todos os golpistas.

Randy Alonso – E que diz que estará por 365 dias no poder. Há que ver o que realmente sucede. Ademais, podemos dizer que ele foi a figura pública de toda essa conspiração contra-revolucionária contra o presidente Chávez.

Hoje víamos os meios de comunicação que, como dizia, desempenharam um importante papel em toda essa conspiração contra a Revolução Bolivariana, e dizia um dos canais de televisão: “Vamos passar a ver a reação do povo ao ocorrido no dia de ontem.” Esse povo era nada mais e nada menos que os grandes empresários da PDVSA, que estavam reunidos, festejando os acontecimentos. Esse é o povo a que se referem aqueles grandes empresários, aqueles golpistas que ontem provocaram a derrubada de um governo democraticamente eleito pelo povo venezuelano.

Pouco depois das três horas da tarde, também nos pudemos comunicar com o Excelentíssimo senhor Julio Montes, embaixador da República Bolivariana da Venezuela em nosso país, que naquele momento estava em Caracas, estava na Venezuela, permaneceu durante toda a noite de ontem junto ao presidente Hugo Chávez, no Palácio de Miraflores, e pudemos obter de Julio Montes as seguintes declarações:

Randy Alonso – Estamos em comunicação, para nossa mesa-redonda, com o embaixador da República Bolivariana da Venezuela em Cuba, Excelentíssimo senhor Julio Montes, que se encontra neste momento em Caracas, também à par dos graves acontecimentos que sucedem na Venezuela.

Saudações, Julio, em nome do povo cubano.

Julio Montes – Bem, irmão, como você está, Randy, saudação ao povo cubano. Aqui estamos, solidários como sempre, na mesma pátria, no mesmo projeto, continuando a luta.

Randy Alonso – Julio, estivemos acompanhando, nosso povo, desde a noite de ontem e em toda a manhã de hoje, esteve acompanhando os graves acontecimentos ocorridos na Venezuela. Sabemos que nas últimas horas do dia de ontem você esteve em companhia do presidente Chávez, no Palácio de Miraflores, nas últimas horas dos graves acontecimentos que ocorreram na Venezuela, e gostaríamos que explicasse a nosso povo quais foram os acontecimentos que levaram à derrubada do governo do presidente Chávez.

Julio Montes – O que aconteceu ontem foi uma máquina demolidora na armação de um golpe de Estado. Desde a provocação que significou enviar a manifestação que esta acontecendo, levá-la a Miraflores, sabendo que estava concentrado todo o povo que apóia o processo do presidente Chávez, isso junto com deixar desguarnecido o Palácio é o que provoca o enfrentamento e os mortos que houve, tudo montado pela contra que hoje tomou o governo na Venezuela. Foi uma armação quase perfeita de um manual de golpe de Estado, o manejo dos meios, que induziram a população a sentir que não havia governabilidade. Produzem-se esses sucessos em que vão se passando, durante a tarde, todos os estamentos das forças armadas, ou melhor, os generais, não os estamentos das forças armadas; os generais foram traindo, um depois do outro, até ficar praticamente só o comandante Chávez, sem o apoio do que é o generalato das forças armadas venezuelanas.

Estivemos no Palácio até a última hora, quando se exigia do Presidente a renúncia ou a imolação. Ali estivemos, um grupo de companheiros, até o final, quando o Presidente preferiu entregar-se, ficar preso. Foi detido no Palácio, o Presidente não renunciou, e produz-se o que é o golpe de Estado. O governo que se produz é um governo de fato, fora da Constituição e, de fato, no dia de hoje começou uma caça às bruxas, violou-se a imunidade parlamentar, há vários parlamentares que tiveram suas casas invadidas.

Os dirigentes do governo do Presidente estão sendo perseguidos, há uma lista: detiveram o Ministro do Interior, estão buscando ao professor Aristóbulo Isturis, ministro de Educação; a María Cristina Iglesias; estão invadindo as instituições e plantando armas, para justificar as futuras detenções. Esta é a situação de hoje.

Estão atentando contra a Embaixada de Cuba, permitindo que as hordas, com a histeria que se produziu, tentem assaltar a Embaixada de Cuba, estamos vivendo essa situação neste momento. Ali, é claro, os companheiros a defenderão até o final, mas sem resposta e sem apoio hoje das instituições na Venezuela. Essa é um pouco a situação, hoje.

As pessoas começam a sair para as ruas. São 15h 21min, estamos em um lugar de Caracas, e começa a sair gente para rua em apoio ao presidente Chávez. É um pouco a situação que estamos vivendo.

Randy Alonso – Soubemos também, Julio, que houve declarações de alguns governadores leais ao presidente Chávez; de vários de seus ministros, inclusive do Procurador Geral.

Julio Montes – Sim, o governador de Táchira, Ronald Blanco; o governador de Mérida, Porras; o governador de Portuguesa, a negra Antonia; o governador de Lara, Reyes Reyes, declararam que não reconhecem este governo de fato e que eles são o governo constitucional, o eleito; que reconhecem o presidente Chávez como seu presidente, porque é o que foi eleito pelo povo na maior legitimidade em toda a história republicana da Venezuela, sete eleições apoiando-o. Bem, é o que está acontecendo.

Também o Procurador Geral da República conseguiu sair pela televisão, em um momento que lhe deram, e anunciou ao país que o Presidente não havia renunciado, que estava detido, e que o que havia ocorrido era um golpe de Estado, que se havia rompido a Constituição, o que a Constituição prevê para esses casos. O presidente não é o Vice-Presidente, a quem caberia a presidência, nem a Assembléia; portanto estamos diante de um governo de fato, um governo que é produto do movimento de ontem, do golpe militar de ontem.

Randy Alonso – Bem, Julio, eu agradeço, em nome do povo cubano, essa informação. Creio, ademais, que são elementos importantes que estamos oferecendo em meio ao que poderíamos chamar uma agressão também midiática sofrida pelo governo do presidente Chávez, e que é parte desse complô para o golpe de Estado. Creio que todas essas informações...

Julio Montes – Randy, uma coisa. Creio também que a luta continua. Chávez é um símbolo do futuro, um símbolo do que é a esperança do mundo, vai projetar-se como símbolo. A gente já começa a pedir que libertem a Chávez, é a consigna que começa a circular pela Venezuela. E digo que é também um grande ensinamento; isso é também um grande ensinamento para os povos, o que é o poder da mídia, dos que detêm o privilégio do poder e, ademais, como o império se move nesta situação.

O presidente Chávez conta com o mais amplo apoio da população venezuelana, assim o demonstram os fatos de ontem, as manifestações de todos esses meses; sem dúvida, pelo controle dos meios e por criar um estado de opinião em alguns setores do país e mobilizando as forças armadas, bem, jogam por terra uma esperança deste povo e deste continente; por algum tempo, porque estão as reservas, estão as forças, e certamente a esperança se acenderá novamente.

Randy Alonso – Bem, Julio, eu gostaria de transmitir a você também a solidariedade do povo cubano, o apoio do povo cubano a Chávez, a você e ao restante dos companheiros que estiveram à frente da Revolução Bolivariana nestes anos, e que contem também com a solidariedade e o apoio do povo cubano. Vocês sabem que somos irmãos nesse combate pela esperança, como você mesmo dizia.

Nossa televisão e nossa rádio continuarão a par dos acontecimentos e denunciando esse complô contra-revolucionário.

Julio Montes – Disso não temos dúvida, porque eu, que estive convivendo com o povo cubano, sei que somos a mesma gente, o mesmo povo, a mesma pátria. Por isso, estamos juntos nesse compromisso pela vida.

Randy Alonso – Reitero-lhe que nossa televisão, nossa rádio, os meios de comunicação cubanos estão abertos também para qualquer informação, para qualquer possibilidade de contacto com vocês, e que seguiremos denunciando esse complô contra um governo constitucionalmente eleito. Estaremos a par de todas as informações.

Randy Alonso – Essa foi a conversação que mantivemos, depois das três horas da tarde, com o Embaixador da República Bolivariana da Venezuela em nosso país, o senhor Julio Montes, e que também contribuiu com importantes elementos sobre o que estava sucedendo, não apenas sobre a tentativa, na noite de ontem, de sujeitar com tanques o Palácio de Miraflores, o presidente Chávez e todos os seus colaboradores próximos que se encontravam naquele lugar, mas também sobre a caça às bruxas que se desatou na Venezuela nas últimas horas, que faz lembrar o golpe constitucional em 1973 contra o presidente Allende, quando muitos dos ministros do presidente Allende foram tirados de suas casas, seus familiares também foram arrastados pelas hordas encabeçadas por Pinochet. Bem, algo similar está acontecendo na Venezuela: ministros, membros da Assembléia Nacional, importantes personalidades do governo venezuelanos estão sendo perseguidas e encarceradas, suas casas estão sendo invadidas.

Um cabo da agência Prensa Latina diz que os três meios de difusão estatais venezuelanos continuam ocupados por efetivos da Guarda Nacional e da polícia. O canal Venezuelano de Televisão encontra-se fora do ar há dois dias, e proibiu-se a seus empregados entrar nas instalações, que estão custodiadas pela polícia. A agência de notícias VENPRES também não está transmitindo, e efetivos da Guarda nacional estão encarregados de controlar suas instalações. Enquanto isso, algo similar ocorre na Rádio Nacional da Venezuela, que apenas transmite música, sem oferecer sua programação habitual, enquanto há militares também em sua sede.

Em todo esse complô contra-revolucionário também tiveram um papel destacado a aristocracia operária, filiada a essa ilegal Central de Trabalhadores, que participou, junto com a Fedecâmaras, da cúpula que levou ao golpe contra-revolucionário, e outras forças golpistas, que inclusive do exterior alentaram esses gravíssimos acontecimentos ocorridos ontem na Venezuela.

Juana Carrasco nos fala sobre isso.

Juana Carrasco – Sim, Randy. Realmente, teve um papel de primeira importância neste golpe o presidente da CTV, a Central de Trabalhadores da Venezuela, Carlos Ortega. Esse indivíduo estabeleceu um aliança sui generis para um suposto líder sindical, visto que acompanhou – em todos os enfrentamento, paredes, greves, provocações, agressões – aos empresários que agora assumiram o poder por meio do Presidente da Fedecâmaras.

Quero dizer que na primeira intervenção feita por Carlos Ortega, diante da imprensa, após esse golpe, ele exortou, nada mais, nada menos, a que seja dissolvida a Assembléia Nacional; ou seja, ele está exortando, precisamente, à perseguição dos que foram legitimamente eleitos pelo povo venezuelano nas eleições.

Randy Alonso – Uma exortação, Juanita, que de passagem posso dizer que foi realmente levada a cabo. As novas autoridades de fato, impostas à Venezuela, disseram que abolirão todos os poderes nacionais e criarão novos poderes, instalados de fato naquele país, incluindo a Assembléia Nacional.

Juana Carrasco – Incluindo a Assembléia Nacional, e isso é o que esteve fazendo. Mas, além disso, oficializou também que a greve geral por tempo indeterminado já estava terminada.

Então, de que Central de Trabalhadores estamos falando aqui? A CTV é tradicionalmente uma agrupação influente nos âmbitos políticos e econômicos venezuelanos; sem dúvida, seus dirigentes, desde a fundação, há 60 anos, não eram senão os designados por arranjos que se faziam na cúpula de dois dos grandes partidos da Venezuela, que são os adecos (AD) e o COPEI. Ou seja, Carlos Ortega é também um adeco, e é o primeiro, e é ao que ele responde, à gente de Carlos Andrés Pérez.

Agora, esse indivíduo, que teve muito pouca preocupação à frente da Central Sindical, porque era quem dirigia a Central Sindical antes das últimas eleições, da qual também vamos falar, muito pouco se preocupou, por exemplo, com o alto desemprego que existia naquele país, com a enorme exploração do povo venezuelano, com a miséria que padeceu durante anos; isso não interessava. Por quê? Porque este era um homem representante da aristocracia operária venezuelana, da aristocracia dos trabalhadores. Ele provém, precisamente, das fileiras da direção sindical da Petróleos da Venezuela, e assumiu a presidência porque os adecos o puseram no cargo. Isso fez que fosse também o que pela primeira vez se qualificou como as eleições mais originais em toda a história venezuelana, que foi quando se convocaram eleições precisamente para eleger aos dirigentes sindicais.

Que coisas fizeram, quando viram que ia escapar de suas mãos o que sempre haviam feito? Reuniram toda a força, todo o poder, todo o dinheiro; mas, além disso, roubaram urnas, queimaram colégios eleitorais, em uma operação realizada em outubro do ano passado, que tinha seus antecedentes, o que simplesmente fez que não se pudessem contar sequer 40% dos votos que haviam sido emitidos pelo milhão de trabalhadores venezuelanos. Simplesmente puseram em prática todas as formas de violência que também estamos vendo agora, no desenvolvimento desse golpe.

Inclusive, naquelas eleições, em três estados da Venezuela, em Zulia, em Anzoátegui e em Delta Amacuro, não se puderam realizar as eleições sindicais, houve coação contra os trabalhadores, para que não votassem pelos representantes do movimento bolivariano, que eram representantes de verdade das massas trabalhadoras daquele país. E assim “ganhou” essas eleições sindicais e, é claro, estimulou a partir daí, e mesmo antes, todos os conflitos laborais havidos e por haver, mais a greves que aqui já se mencionaram. Inclusive, em março, parece-me que fez, junto com a Fedecâmaras, algo substancial, que foi o chamado Pacto de Governabilidade, ou as bases para um acordo democrático, em que Carlos Ortega declarou que o que se tentava era conseguir a iminente saída do senhor Chávez da primeira magistratura; ou seja, que em março já estavam anunciando esse golpe de Estado que deram agora.

Eu me perguntaria sobre Ortega – antes de entrar em outro – que vai fazer agora?, porque ele dizia que um líder sindicalista deve ser de oposição ao governo. Vai opor-se a seu amigo e sócio, Pedro Carmona? É claro que não.

Mas há outro personagem que esteve atuando do exterior, esteve atuando da República Dominicana, onde residia; esteve atuando de Miami, onde também tinha residência, e em cujas últimas declarações, que acaba de fazer em Nova York, diz que vai regressar à Venezuela, e estou me referindo ao ex-presidente Carlos Andrés Pérez, adeco.

O que pretende Carlos Andrés Pérez, simplesmente? Diz ele que está satisfeito com que precisamente um grande colaborador seu, Pedro Carmona, esteja agora à frente do país. Qualificou-o de empresário preparado, de economista de profissão, de vocação democrática, que diz que tem.

Quem está falando de vocação democrática? Quem está chamando Chávez de ditador? Está falando o Carlos Andrés Pérez que mandou reprimir e matar a vários milhares de venezuelanos no Caracazo, quando os moradores de El Cerrito desceram para pedir comida e para pedir um trabalho, que não tinham, e simplesmente banhou de sangue o povo venezuelano; ou aquele que roubou o tesouro do Estado, que exatamente estava sendo agora processado pelas malversações que tinha feito durante seus dois governos, e inclusive era procurado pela INTERPOL.

E que diz? Diz: “Já estou nos preparativos de meu regresso à Venezuela, mas à margem de toda ambição pessoal, apenas quero contribuir com minhas experiências políticas.” Suas experiências políticas foram essas, o Caracazo e os 3.000 mortos dos cerros de Caracas, e o roubo do tesouro daquela nação.

Randy Alonso – É outra parte de toda essa tramóia, quem são alguns integrantes dessa cúpula contra-revolucionária, que levou ao golpe que derrubou o presidente Hugo Chávez na madrugada de hoje, um golpe militar, um golpe contra a constitucionalidade venezuelana, que levou também à perseguição dos ministros e de personalidades importantes daquele país.

Após as cinco horas da tarde, tivemos a oportunidade de nos comunicarmos com Aristóbulo Isturis, o Ministro de Educação do presidente Hugo Chávez, uma das personalidades assinaladas para ser detida, buscada pelos golpistas e que também tem sido denegrido pelos meios de comunicação venezuelanos.

Proponho que escutemos as declarações que nos fez o Ministro de Educação venezuelano.

Randy Alonso – Estamos em comunicação novamente com a Venezuela. Estamos em contacto com o senhor Aristóbulo Isturis, Ministro de Educação do governo do presidente Hugo Chávez, derrubado pelas forças contra-revolucionárias.

Gostaríamos, Ministro, de cumprimentá-lo em nome do povo de Cuba e de pedir sua opinião sobre o que está sucedendo neste momento na Venezuela, os últimos acontecimentos e a derrubada do presidente Chávez.

Aristóbulo Isturis – Randy, eu estive com o presidente Chávez até a hora... no Palácio de Miraflores, e posso garantir que o Presidente nunca renunciou. O Presidente disse-lhes que os responsabilizaria e que assumissem a responsabilidade do que significava um golpe de Estado, e que seu governo seria um governo de fato, seria um governo ditatorial, seria um governo contrário à Constituição Bolivariana. Nesse sentido, ele iria preso, mas nunca assinaria a renúncia, porque se assinava a renuncia não seria golpe. O presidente Chávez nunca assinou a renúncia.

Eles tentaram impor ao presidente Chávez uma declaração de renúncia. Deram-lhe um tempo, um lapso; se o Presidente não se entregava nesse lapso, naquele momento eles atacariam o Palácio, e nós discutimos isso com o Presidente, que disse: “Basta esse derramamento de sangue, que se nós seguíssemos lutando, e que era melhor preservar a integridade de muitos de nossos quadros, e que não havia por que sacrificá-los, e que ele iria preso, mas que nós ficaríamos vivos”. Nós acompanharíamos o Presidente, fosse qual fosse sua decisão. O Presidente então foi detido, neste momento eles o mantêm incomunicável. Nem o Procurador Geral da República pôde ver o presidente Chávez, e não lhe permitiram falar.

O Procurador disse hoje publicamente, que se era um governo de fato, uma ditadura ou o quê, o que havia no país. Não nos permitiram entrar hoje em nenhum ministério, estão invadidos, começaram a expulsar todos os ministros; essas ocupações são televisionadas. Levam turbas que cospem, violam, vexam aos ministros, aos familiares. Assim fizeram ao Ministro de Relações Interiores, aos familiares do vice-presidente Diosdado Cabello; violaram a imunidade parlamentar do deputado Karel William Sáez, arrancaram-no de sua casa a chutes, a empurrões, em meio à turba; estão fazendo campanhas de terror.

No meu caso, dizem que o prefeito de Caracas e eu somos os mais perigosos e os mais procurados, que nos procuraram por toda parte e não nos encontraram, o que é mentira, porque eu, desde as 3h 30min da manhã, depois que estive com o Presidente, vim para minha casa e estive em minha casa, de manhã fui um momento a um dos canais de televisão para dizer: “Olhem, eu estou aqui em minha casa, não é verdade o que vocês estão dizendo.” Não nos deixam falar nos periódicos e não nos permitem falar na rádio da Venezuela, estamos praticamente incomunicáveis com a opinião pública.

Neste momento estão assediando a Embaixada cubana e, além disso, fizeram uma mobilização de pessoas inimigas de nosso processo ao redor da Embaixada.

Que dizer? Em seis horas, essa gente fez um desastre, do ponto de vista dos direitos humanos, a violação, a incomunicabilidade dos detidos, a incomunicabilidade do Presidente, as invasões sem explicações, o escárnio público para cada dirigente e a incomunicabilidade de cada um de nós e dos detidos.

Já invadiram a casa de minha mãe, a casa de minha irmã, e virão por mim. Eu não me movi de minha casa, vou esperá-los aqui. Tenho tentado comunicar-me com todos os meios internacionais, porque é a única maneira de repercutir na Venezuela, e por isso agradeço muitíssimo, irmão, que tenha me chamado.

Randy Alonso – Ministro, com essa caça às bruxas que se desatou na Venezuela nas últimas horas, o senhor considera que haja segurança para a vida do presidente Chávez?

Aristóbulo Isturis – Nós tememos pela vida do presidente Chávez, e se a negociação demorou um pouco foi porque nós, para poder sair e não morrer com o Presidente ali e não lhes dificultar a tomada do Palácio, impusemos como condição a preservação da vida do presidente Chávez. Não vão cumprí-lo, todo mundo sabia que não iam cumprir.

Pedimos que os organismos internacionais velem pela vida do presidente Chávez e pela vida de todos os funcionários do governo de Chávez.

Randy Alonso – Bem, ministro Aristóbulo, há algum outro elemento que o senhor queira destacar, da situação das últimas horas?

Aristóbulo Isturis – Bem, irmão, que isto é um estado de fato, que vocês estejam atentos ao destino dos venezuelanos e dos lutadores sociais venezuelanos, que este dia abre-se para nós um panorama bastante duro, bastante difícil; sabemos que é parte da luta, sabemos que na Venezuela iniciou-se uma mudança, essa mudança não vai retroceder, foi interrompida. Nós vamos retomar a qualquer momento a condução do processo revolucionário bolivariano e, pra frente, irmão!, pra frente, pra frente!

Randy Alonso – Ministro Aristóbulo, reiteramos a confiança do povo cubano no senhor e nos demais dirigentes da Revolução Bolivariana, as demonstrações de carinho e de solidariedade que vocês sempre receberam do povo cubano. Saibam que nosso povo está a par de todos os acontecimentos e se solidariza com o povo venezuelano.

Aristóbulo Isturis – Eu estive na “Lázaro Peña”.

Saudações a todos os amigos de lá, e esta é a luta.

Randy Alonso – Reiteramos nossa solidariedade de irmão cubano e dizemos que estaremos a par dos acontecimentos, que a rádio e a televisão cubanas estão abertas para o senhor, para todos os lutadores venezuelanos, para que se continue divulgando a verdade sobre esse complô contra-revolucionário contra o presidente Chávez e contra seu governo constitucional.

Aristóbulo Isturis – Muito obrigado.

Randy Alonso – Muito obrigado por suas declarações para nossa televisão.

Randy Alonso – Um cabo da agência AFP, precisamente a partir disso que abordava o Ministro de Educação do destituído presidente Chávez, diz que “o defensor do povo venezuelano, Germán Mundarain, denunciou esta sexta-feira uma massiva violação de direitos humanos, que deve parar, na Venezuela, após a queda do presidente Hugo Chávez na véspera e sua substituição por uma junta de governo, encabeçada pelo presidente da cúpula empresarial Fedecâmaras, Pedro Carmona.

“ ‘Acreditamos que há uma massiva violação de direitos humanos, que deve parar, pelo bem de todos os cidadãos e o bem do país. É uma massiva violação de direitos, que estimamos está vinculada a uma cruzada de vingança’, declarou Mundarain à emissora União Rádio.

“O defensor público, que ainda está em seu cargo, manifestou preocupação pela forma como estão sendo detidos parlamentares e ministros, que gozam de prerrogativas especiais. ‘Preocupa-nos como se detêm governadores, vereadores e prefeitos’, disse. ‘Várias dessas detenções, inclusive, foram televisionadas’.

“ ‘O organismo abriu uma investigação pela situação que vive o país’, assinalou. ‘Não é possível que as massas estejam participando em um ato que parece mais ser de vingança que de justiça’, disse, ao referir-se às detenções e invasões televisionados, às quais comparecem opositores do Presidente deposto.”

Esse uso da televisão foi parte importante de todo o complô que se armou contra o presidente Chávez, contra o governo constitucionalmente eleito da Venezuela.

Os meios de comunicação desenvolveram uma guerra midiática nessa jornada, que foi também um impulso a esse golpe contra-revolucionário. Rogelio Polanco comenta sobre isso.

Rogelio Polanco – Foi uma guerra midiática, que ontem teve sua consolidação, teve sua expressão maior, mas que vinha, recordemos todos como essa guerra midiática se produziu durante meses, durante anos do processo bolivariano, e que o governo, as autoridades e a política de Chávez foi atacada sistematicamente pelos principais meios de difusão que se mantinham em poder dessa aristocracia, desses poderosos meios, em mãos dos mesmos que se vincularam à cúpula empresarial e à ilegal central de trabalhadores.

Há alguns que colocaram que foi, primeiro, um golpe midiático, ou seja, que foram primeiro os próprios meios e, sobretudo, as televisões privadas as que tomaram o poder e depois estiveram instigando a violência e a que se produzisse finalmente o golpe de Estado. Ou seja, que na prática houve uma só visão dos acontecimentos durante horas pelas cadeias de televisão privadas, às quais se somaram também cadeias de televisão internacionais, que deram uma só visão e que produziram confusões importantes nos meios de difusão internacionais e na opinião pública internacional.

Há que dizer que se esteve ontem, de maneira evidente, buscando um Pinochet, por parte dos meios. Apareceram os próprios dirigentes empresariais corruptos, alguns militares, falou-se de alguns chefes militares midiáticos, que apareciam, um depois do outro, falando da desestabilidade e da necessidade de tomar as decisões que depois essa junta de fato tomou e, portanto, creio que houve uma imensa responsabilidade dos meios de difusão no que aconteceu ontem e no que está acontecendo hoje na Venezuela, que foi claramente denunciado ontem à tarde pelo próprio Hugo Chávez, que durante muitas intervenções públicas havia se referido ao papel irresponsável, à provocação a que estavam conclamando os meios de difusão.

Em algum momento, o próprio Hugo Chávez dizia ontem a La Jornada que “em dias passados havia grupos de encapuzados” – prestem atenção nisto – “que se escudavam atrás das câmaras de televisão privadas para atacar com pedras durante manifestações de rua”. Ou seja, que, ao não obter uma resposta das televisões ante essas provocações que se estavam evidenciando naqueles dias, tomou-se esta decisão, informada ontem pelo próprio presidente Chávez, de que fossem suspensas algumas dessas televisões privadas que estavam instigando a violência e que, além disso, mantiveram-se durante horas divulgando por seus meios, ao vivo, diretamente, os distúrbios.

Hoje eu creio que poderíamos perguntar onde está a ética desses meios, onde está hoje a Sociedade Interamericana de Imprensa, que esteve atacando constantemente o governo de Chávez, ante esses sucessos tão graves que ocorreram; onde está a liberdade de expressão dos meios de difusão na Venezuela; onde estão agora os defensores dos direitos humanos, quando se silenciou por completo o que está acontecendo no país e onde se impede, inclusive, que alguns dos principais dirigentes possam falar ao povo e à opinião pública internacional, para denunciar o golpe de Estado que está ocorrendo no país.

Randy Alonso – Sim, Polanco, para os que tivemos a oportunidade de ver essas televisões por algumas horas, para acompanhar esses acontecimentos e trazer a informação a nosso povo, realmente eram repugnantes as diatribes dessas televisões privadas venezuelanas, a manipulação dos fatos, a manipulação de tudo que aconteceu.

Inclusive representantes da Venevisión, uma das empresas privadas mais importantes da Venezuela, alardeavam o fato – e o reconheciam – de que, pela primeira vez, os meios de comunicação haviam enfrentado um governo venezuelano; sinal reconhecido por eles mesmos de qual foi a posição, desde o primeiro momento, dos meios de comunicação privados na Venezuela, que estão em mãos dessas cúpulas empresariais, que também se aliaram ao golpe contra o presidente Chávez, e que nos dão uma amostra do que foi o enfrentamento dos meios de comunicação, em mãos das empresas privadas, contra a Revolução Bolivariana, que tentou resolver os problemas da grande maioria dos venezuelanos, algo a que sempre se opuseram essas cúpulas empresariais.

Disto se poderia falar muito mais, do papel dos meios de comunicação, creio que dá para bastante, mas são alguns exemplos que se poderiam expor para nosso povo. Os mesmos meios de comunicação que cortaram no ar declarações de ministros, de pessoas aliadas ao presidente Chávez, qualquer menção ao golpe de estado foi imediatamente tirada do ar nessas emissoras, como ocorreu hoje nas transmissões de televisão, não nas emissões da CNN para o exterior, que também exerceu um papel midiático importante no que aconteceu ontem, a CNN em espanhol realmente manipulou os acontecimentos, e teve também um importante e destacado papel no que ali aconteceu. Mas, bem, a CNN em espanhol hoje transmitiu completas as declarações do Procurador Geral da República da Venezuela, não assim as televisões venezuelanas, que cortaram suas declarações no ar.

Eu lhes proponho ver essas declarações do Procurador Geral venezuelano.

Isaías Rodríguez – Eu quero começar dizendo-lhes que o Ministério Público tem neste momento três procuradores no Forte Tiuna, entre eles a diretora de Direitos Fundamentais, Magali García Malpica.

O propósito dessa visita do Ministério Público ao Forte Tiuna é entrevistar o presidente, ou o ex-presidente Chávez, como queiram chamá-lo, os que queiram qualificá-lo neste momento.

Por que entrevistá-lo? Em primeiro lugar, porque temos a informação, por parte dos procuradores militares que o entrevistaram, de que o Presidente não renunciou. Se efetivamente o Presidente não renunciou, se não se mostrou em nenhum momento ao Ministério Público a declaração escrita, expressa dessa renúncia, o presidente Chávez continua sendo o Presidente da República da Venezuela. Mas no hipotético caso de que o Presidente tenha renunciado, a renúncia do Presidente é diante da Assembléia nacional, e somente quando a Assembléia Nacional aceita essa renúncia é quando se pode ter como válida a renúncia do Presidente. Portanto, mesmo no suposto caso de que o Presidente tenha renunciado, efetivamente continua sendo o Presidente da República, porque não se realizou o ato na Assembléia Nacional onde se valida a suposta renúncia do Presidente.

Mas quero assinalar mais algumas coisas: o Presidente da República está neste momento privado de liberdade, está incomunicável, nem sequer ao Ministério Público se permitiu ... (interrupção)... ao Presidente da República. Temos informações de referência, através de alguns procuradores militares, que deram essa informação aos procuradores do Ministério Público que estão neste momento.

Ou seja, estamos em uma situação onde, realmente, há uma violação total e absoluta da Convenção Interamericana dos Direitos Humanos.

Mas, ademais, nesta situação há um fato mais significativo: se está privado de liberdade, que delito cometeu, o delito de renunciar? Será a renúncia um delito?, no suposto caso de que seja essa a situação. E se renunciou e isso é um delito, por que é mantido incomunicável, e por que não se permite, de nenhuma maneira, ao Ministério Público, entrevistá-lo através da Diretora de Direitos Fundamentais e dos procuradores que acompanham a essa Diretora?

A situação é realmente grave, do ponto de vista constitucional; ou seja, há um Estado de fato, realmente a situação é de fato, não há um Estado constitucional. E não estou falando da Constituição de 1999, é que nem na Constituição de 1961 pode-se estabelecer a legalidade ou a constitucionalidade de uma situação como esta.

Por outro lado, quem substitui ao Presidente é o Vice-Presidente. Não consta, de nenhuma maneira, que o Vice-Presidente também tenha renunciado, nem consta a destituição do Vice-Presidente da República da Venezuela, e no suposto caso de que o Vice-Presidente houvesse também renunciado, cabe, pela Constituição, a presidência da República ao Presidente da Assembléia Nacional. O  que quer dizer que os fatos, como estão colocados neste momento na Venezuela, violam o Protocolo de Washington.”

Randy Alonso – Estas foram declarações do Procurador Geral, que, repito, foram cortadas no ar em vários dos meios de comunicação venezuelanos, não foram transmitidas integralmente.

Enquanto isso, soube-se pela agência AFP que o embaixador dos Estados Unidos na Veneauela, Charles Shapiro, disse nesta sexta-feira que “apesar dos trágicos incidentes da quinta-feira, esse foi um dia extraordinários para o país que governava o destituído presidente venezuelano Hugo Chávez”.

“Lendo um comunicado oficial na emissora União Rádio, Shapiro qualificou o dia 11 de abril como um dia extraordinário na história venezuelana, embora também tenha afirmado que foi um dia trágico. Saudou as intenções manifestadas por Carmona, como cabeça da Junta de governo transitório, de fortalecer as instituições e os processos democráticos, dentro de um quadro de respeito aos direitos humanos e de um Estado de Direito. Sublinhou que a Embaixada estadunidense continua observando muito de perto os acontecimentos da Venezuela.”

Enquanto isso, esta tarde, também, como disse nosso chanceler Felipe Pérez Roque, o grupo de pessoas que responde aos golpistas e que se apoderou da direção da Petróleos da Venezuela – a empresa venezuelana que tem a ver com esse importante item energético –, divulgou declarações referentes ao intercâmbio estabelecido com a República de Cuba, o Gerente de Distribuição da PDVSA dirigiu-se hoje aos meios de comunicação, e estas foram suas palavras:

Jornalista – Entrementes, a Estatal de Petróleos da Venezuela, PDVSA, anunciou a suspensão indefinida de remessas de petróleo a Cuba. A amizade de Hugo Chávez com o mandatário cubano Fidel Castro havia convertido a Venezuela no principal parceiro comercial da ilha.

Edgar Paredes – “... uma boa notícia: Não vamos enviar mais nenhum barril de petróleo a Cuba.”

Randy Alonso – Isso dizia esse representante da PDVSA. Essa foi a notícia, foi também a reação da cúpula empresarial da PDVSA, aliada aos golpistas, que está agora à frente dessa empresa e que contribuiu grandemente para os sucessos do dia de ontem, para a derrubada do presidente constitucional da Venezuela, Hugo Chávez. Como contribuiu também o generalato das Forças Armadas Venezuelanas, as mesmas forças armadas que à tarde haviam declarado a constitucionalidade do Presidente, a defesa da ordem constitucional, e que à noite ameaçaram com voar em pedaços o Palácio Presidencial. Eduardo Dimas comenta sobre isso.

Eduardo Dimas – Quarenta altos oficiais venezuelanos fizeram o mesmo que muitos outros oficiais latino-americanos ao longo da história de nosso subcontinente; ou seja, traem o papel que lhes atribui a Constituição, traem o dever que têm de defender os poderes legítimos do país e consumam a traição sempre também da mesma maneira, uma maneira ardilosa, baixa, suja, que é o que os caracteriza quando ocorre esse tipo de situação.

Ao longo do dia de ontem, em várias ocasiões, o alto comando militar do exército venezuelano dá a Chávez garantias de que têm o controle do país e lhe reiteram tanto a sua fidelidade à Constituição, como ao próprio Presidente; à tarde, se rebelam.

Tenho aqui, por exemplo, uma declaração do inspetor geral da Força Armada nacional, general Lucas Rincón, que desmente, em um breve comunicado rádio-televisivo, que Chávez está detido ou em um quartel militar, e reitera a fidelidade ao governo de Chávez.

Tenho, por outro lado, as declarações. Ou seja, às 10 horas da noite, concretamente, dois generais: Luis Camacho Kairuz, ex-vice-ministro de Segurança nacional, e o general Rafael Damiani Bustillos apresentam-se em um canal da televisão para anunciar que tudo está sob controle do exército, e que Chávez tem de renunciar.

Esse general, nessa situação, faz a seguinte declaração: “Esta noite pedimos perdão ao povo venezuelano pelos sucessos ocorridos e que afundem uma força que se supõe incapaz de cumprir sua missão. Os mortos de hoje não se podem tolerar.” Esse mesmo general e todos os demais generais toleraram os mortos provocados pelo Caracazo, que foram mais de mil, como já se disse aqui nesta mesa. E há o comandante general do exército da Venezuela, Efraín Vásquez, que é quem se rebela – parece que é um dos principais elementos do golpe; bem, poder militar tem para isso – e ordena a seus subalternos manter-se em suas unidades. Disse ter – no momento em que dá essa ordem e que se dá a conhecer – 95% das forças armadas de seu lado, e 40 oficiais de alta patente. Dizia-se que havia um oficial de alta patente que não queria que se desse o golpe; mas, em definitivo, o golpe se consumou.

Creio, Randy, que há duas questões aqui que não podemos esquecer: em primeiro lugar, o papel desempenhado historicamente pelo exército dos Estados Unidos, como assessor de todos os exércitos latino-americanos, e, em segundo lugar, que quando falamos da ajuda que recebiam esses grupos da Fedecâmaras, os sindicatos, quer dizer, os setores que, em definitivo, opunham-se a Chávez, temos de falar da Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos, das declarações feitas, por exemplo, em janeiro, pelo diretor da Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos, Georges Tenet, e das declarações, inclusive, do próprio secretário de Estado dos Estados Unidos, Colin Powell; porque esse golpe, se tem um pai, tem também mãe, e eu não saberia qual dos dois é, mas, evidentemente, esse golpe recebeu muito apoio, muita ajuda. E as declarações de Shapiro, que certamente é nosso conhecido, porque dirigiu o gabinete de Cuba no Departamento de Estado e como prêmio recebeu a tarefa de ajudar a desestabilizar o governo de Chávez na Venezuela, creio que dão a medida de que papel desempenharam os Estados Unidos em tudo isso.

Randy Alonso – Dimas, frente a todos esses acontecimentos, houve também a condenação de importantes forças políticas de nosso continente.

Há um cabo da ANSA que diz que “o Partido dos Trabalhadores, o PT, o maior da oposição no Brasil, condenou hoje o que denominou golpe de Estado que destituiu ao presidente Hugo Chávez, da Venezuela, e demandou aos organismos internacionais que não reconheçam a autoridades que não sejam legitimadas no Estado de Direito.”

Enquanto isso, como se dizia, nas conversações que tivemos com importantes personalidades venezuelanas durante nossa mesa-redonda, houve uma caça às bruxas, uma busca de personagens, ou de importantes membros do governo de Chávez, aos quais trataram de humilhar, arrancaram-nos de suas casas e, ademais, violentaram-nos fisicamente, entre eles está William Lara, o presidente da Assembléia Nacional Bolivariana da Venezuela.

William Lara conseguiu fazer algumas declarações aos meios de comunicação venezuelanos, uma delas foi ao canal Globovisión, um dos canais privados que também contribuiu para o golpe de Estado do dia de ontem. Globovixión editou grosseiramente essas declarações de William Lara e, inclusive, tirou-as do ar. Proponho-lhes ver o que disse o Presidente da Assembléia Nacional venezuelana.

William Lara – Há uma constrangedora, asfixiante, opressiva campanha midiática para maquilar essa ditadura que se tenta instaurar na Venezuela.

...Quer-se disfarçar de democracia; mas observem vocês a contradição, como é possível chamar de democrático a um regime que se inicia dissolvendo o Parlamento eleito pelo povo? Isso é uma ditadura.

Jornalista – ... no nível social, o que isso pode provocar?

William Lara – Isso, simplesmente, reafirma que estamos frente a um regime ilegítimo e ilegal, e a sociedade democrática venezuelana, a sociedade que tem os valores democráticos arraigados, não vai aceitar...

Randy Alonso – Bem, aí foram tiradas do ar as declarações de William Lara, o que é parte dessa “liberdade de expressão” de que se vangloriaram esses meios durante todos esses meses de enfrentamento contra o governo de Chávez, meses em que denegriram todas as figuras públicas da Venezuela, e o de ontem foi o cúmulo da manipulação e o cúmulo da difamação de um meio de comunicação em seu atuar.

Creio que é parte de toda essa tramóia que levou ao golpe contra-revolucionário; um golpe que, ademais, para assombro de alguns, mas para confirmação de outros, um cabo da EFE em Washington diz que “ainda que a situação da Venezuela esteja ‘tecnicamente’ sob o previsto na famosa carta democrática, sobre o rompimento da ordem constitucional, fontes consultadas pela EFE indicaram que na OEA há pouco ambiente para iniciar algum procedimento. O máximo que se vai fazer é invocar o espírito da Carta constitutiva da OEA e fazer um apelo à normalização democrática na Venezuela; mas é altamente improvável que se invoque a Carta Democrática e se convoque a um conselho permanente, indicaram hoje fontes da organização hemisférica que pediram anonimato”.

Algumas das reações internacionais, junto à dos Estados Unidos e esta da OEA, tem Lázaro Barredo.

Lázaro Barredo – Sim, Randy, penso que houve declarações inconseqüentes, como as dos Estados Unidos e as de alguns aliados europeus, que vou mostrar, e outras muito vacilantes, que denotam realmente que agora, de imediato, não se vai fazer quase nada fora do retórico, em uma linguagem que, volto a dizer, cada qual tire suas próprias conclusões.

“A Casa Branca”, diz um cabo da EFE, “considerou hoje que o governo do ex-presidente venezuelano Hugo Chávez foi o causador da crise que provocou seu final” – nós aqui demos todos os elementos –, “por ordenar que se disparasse ontem, quinta-feira” – uma injúria realmente, uma falsidade, uma mentira – “contra uma manifestação pacífica da oposição”, quando foi exatamente o contrário. Isso foi dito pelo porta-voz da Casa Branca, Ari Fleischer, que, sem dúvida, atreve-se a dar essa declaração quando diz depois – essa é a superficialidade constante, mas que se destaca neste mundo –: “Os detalhes ainda são pouco claros, mas o que sabemos é que as ações fomentadas por Chávez provocaram uma crise”, esse é o anti-chavismo desmedido dessa administração.

“Estados Unidos e a Espanha instam a OEA assistir à democracia na Venezuela”, um cabo da DPA, a Agência Alemã de Imprensa, emitido hoje em Washington. “Estados Unidos e a Espanha instaram hoje a Organização dos Estados Americanos a assistir à Venezuela na consolidação de suas instituições democráticas, em um comunicado conjunto”, ou seja, a assistir, não é a condenar nem nada assim.

“O FMI, o Fundo Monetário Internacional, pronto para trabalhar com novas autoridades da Venezuela”, depois de tudo que boicotaram, tudo que fizeram.

“Estados Unidos elogia as Forças Armadas venezuelanas e pede restauração democrática.”

A vacilação: “Grupo do Rio condena ruptura da ordem democrática na Venezuela”.

Reuter. “Os presidentes do Grupo do Rio condenaram, na sexta-feira, o que chamaram ‘ruptura’ – há que ouvir a linguagem – ‘da ordem democrática na Venezuela, depois de uma explosão de violência que forçou a saída do presidente Hugo Chávez’, e instaram a eleições livres no país.”

E nisso ficaram os mandatários dos 19 países latino-americanos – com a presença somente de 11 presidentes – reunidos em São José. “Condenam a interrupção da ordem constitucional na Venezuela, gerada por um processo de polarização crescente”, diz a declaração lida por um dos presidentes.

Enfim, isto é mais ou menos continuar no mesmo. Outros que apóiam realmente o governo venezuelano imposto, como o governo da Colômbia, que está confiando no “imediato regresso à Venezuela da democracia, em mãos do novo presidente integracionista”, segundo um porta-voz do governo venezuelano, ao dirigente empresarial venezuelano Pedro Carmona. E é mais ou menos nesse tom que se pronunciam as demais declarações de muitos governos latino-americanos, de vários governos europeus, que vêm, nessa mesma linha da Espanha e dos Estados Unidos, instar a OEA a manifestar-se, a apoiar, a ajudar ao novo governo a que estabeleça um regime democrático.

Randy Alonso – Nessa linha, Lázaro, hoje se publicou pela agência AFP uma análise de analistas políticos bolivianos, a Bolívia é um país que viveu uma ditadura militar. Diz que “analistas políticos bolivianos afirmaram, nesta sexta-feira, que na Venezuela deu-se um golpe militar que provocou uma ruptura da institucionalidade, e que pode ser um perigoso antecedente para a América Latina.

“ ‘O que aconteceu na Venezuela é um golpe militar apoiado por um setor da população’, assegurou o cientista político boliviano Jorge Lasarte, ex-vogal do Tribunal Eleitoral Boliviano, que expressou preocupação porque se rompeu o processo constitucional e isso não se pode ocultar com o Presidente sendo obrigado a renunciar.

“Na mesma direção opinou a analista Jimena Acosta, ao destacar que ‘é preocupante que um país recorra ao golpe militar para mudar um governo; mas o que mais surpreende – disse essa analista – é que a ruptura dessa institucionalidade, que tanto custou construir aos países da América Latina, seja vista com tanta naturalidade, indiferença ou beneplácito pela comunidade internacional’, apontou Acosta.”

Estas são as informações que continuam chegando à nossa mesa-redonda, das agências internacionais de notícias.

Por último, gostaria de informar a nosso povo e à opinião pública internacional, que as últimas notícias, que chegaram aproximadamente às 18h 15min, sobre os acontecimentos da Embaixada da República de Cuba na Venezuela, são que cerca das 4 horas da tarde, em meio ao ruído ensurdecedor da multidão que cerca a Embaixada, avisam ao Embaixador que o chefe da Polícia Metropolitana queria reunir-se com o Embaixador. Ao informá-lo a Cuba, foi orientado a certificar-se de que esse alto chefe realmente desejava reunir-se com ele , em cujo caso deveria autorizá-lo a entrar.

Realmente chegou, acompanhado de duas pessoas mais, um representante da Prefeitura Maior, em nome do prefeito Peña, e o prefeito do município Baruta, Enrique Capriles, os quais solicitaram, adicionalmente, a presença de representantes dos canais 33 e 2.

Germán, nosso embaixador, assinalou que aquelas pessoas, instigadas por um pequeno grupo, prestaram-se a destruir veículos, cortar água e eletricidade, e falaram, inclusive, de impedir acesso à comida, situação que poderia chegar a ser de incalculáveis conseqüências, e que se ocorresse uma invasão, nosso pessoal defenderia a Embaixada, ainda que ao preço de suas vidas.

Eles disseram que as pessoas estavam afora porque suspeitavam que ali estava Diosdado Cabello e outros ministros. Germán negou.

Perguntaram se lhes seria dado asilo, caso solicitassem; Germán respondeu que era faculdade de quem outorga o asilo decidir.

Pediram para fazer “um percurso amigável”, ou seja, uma inspeção pela Embaixada, para comprovar que não estavam ali Diosdado e os outros; justificaram-no dizendo que – cito – “neles, sim, a multidão acreditaria, e a Germán não”. Germán rejeitou, assegurando que em 40 anos não havíamos jamais aceitado uma inspeção. Tentaram então que a inspeção fosse feita pelo Embaixador norueguês, que se ofereceu. Germán agradeceu sua amabilidade e explicou as agressões e violências que a Embaixada sofria.

Germán assegurou a determinação do pessoal de defender a Embaixada, na qual havia, inclusive, cinco mulheres e uma criança.

Finalmente, o chefe da Polícia Metropolitana, o representante do Prefeito Maior, e o prefeito de Baruta prometeram que assegurariam que a multidão não entrasse na Embaixada. Veremos o que ocorre.

O Ministério de Relações Exteriores informou essa situação ao Secretário Geral das Nações Unidas, ao Presidente do Conselho de Segurança, ao Movimento de Países Não-Alinhados e a um numeroso grupo de embaixadores credenciados em Cuba e em Caracas.

A responsabilidade por qualquer desenlace violento caberá aos golpistas e a quem assumiu ilegalmente a presidência do nobre e sofrido país venezuelano.

Com esta informação, estamos dando ponto final a esta mesa-redonda informativa de hoje.

Quero agradecer aos comentaristas que me acompanharam, aos convidados que estiveram conosco no estúdio, e dizer a nosso povo que nossos meios de comunicação continuarão a par dos acontecimentos na Venezuela.

Continuaremos informando sobre a tramóia, o complô contra-revolucionário que levou à destituição do presidente constitucional daquele país, Hugo Chávez Frías, e manteremos nosso povo a par de todos esses acontecimentos.

Agradeço a todo o nosso povo sua atenção.

Muito boa noite.